quarta-feira, dezembro 13, 2006

ROCK HORROR SHOW


Rob Zombie sem maquiagem é mais feio que o zumbi ao seu lado...

Lembram do Rob Zombie? É aquele mesmo, que parecia um misto de Beato Salú/Pedro de Lara com morto-vivo saído da série “Evil Dead”, e que promovia um mix bacana de rock industrial, cine trash e heavy metal. Pois é, o tempo, as cenas e o gosto-comum dos norte-americanos (sua terra-natal) transformaram-no em fumaça de despacho na encruzilhada, e o cara meio que foi esquecido nos pesadelos neófitos da garotada em prol de emossexualismos e bandas gótico-farofa de quinta. Meus caros amigos, mas a carreira do cara não era assim tão desprezível, a começar por sua antiga banda, o White Zombie. Tenho em casa quatro discos dele: “La Sexorcisto”, 1992 - metalzão dos bons, com influências sutis de industrial e hard rock (notadamente o Kiss); “Astrocreep 2000”, 1995 – radicalização eletrônica do som original da banda, mas pegando pesado em refrões poderosos e climas de horror B (também tenho o disco de remixes “Supersexy Swingin’ Sounds”, 1996, muito bom!); e sua primeira investida solo, “Hellbilly Deluxe” - uma continuação natural do último disco de sua ex-banda. Depois disso, deu no saco – pra mim e para o mundo. Parecia que o som dele não tinha mais pra onde correr. Mas, em pleno ano de 2006, resolvi baixar seu petardo mais recente, “Educated Horses” (2006), e chapei o coco!

A vinheta de abertura, “Sandwist In The Blood”, parece ter saído de algum dos filmes que Rob Zombie dirigiu – pra quem não sabe, o cara inclusive está mais envolvido com produção e direção de filmes de terror B atualmente do que com sua própria banda. “American Witch” vem a seguir com uma pegada hard rock/heavy metal que só poderia vir da mente de alguém que sabe que o metal não surgiu com Korn e Linkin’ Park. “Foxy Foxy”, com sua levada dançante, efeitos eletrônicos e refrão pop pode indicar que nada mudou desde “Hellbilly Deluxe”. Ledo engano: Zombie está cantando com voz mais fina e menos agressiva, totalmente glam, e a viagem a seguir vai fundo na highway to hell. “17 Year Locust” tem aquela pegada stoner-metal estilo Corrosion of Conformity. “The Scorpion Sleeps” parece Gary Glitter numa dança de cadáveres. A vinheta “100 Ways” abre caminho para o heavy-rock acelerado de “Let All Bleed Now” elevar os picos de adrenalina. “Death Of It All”, com seu começo dedilhado no violão, engana e parece apelar para aquelas baladas neo-góticas atuais, mas o clima aqui é outro. Aliás, Rob Zombie se destaca de toda esta praga de hoje disseminada por Evanesence e Nightwish (destes dois eu fiz questão de não colocar seus respexctivos links!) pelo simples fato de possuir um senso de humor negro e ao mesmo tempo auto-irônico. Que banda pseudo-depressiva dessas teria coragem de gravar um blues em clima de horror sanguinário (“The Devil’s Reject”) e enfiar cacetadas sem medo de soarem malvadonas e envenenadas por todos os lados? – vide “Ride” e “Lords of Salem”, que encerram o disco, além de todas as outras citadas. Esse Zombie aí agora só comete seus assassinatos em série para platéias selecionadas, pois seu som – graças aos diabos! – não se resvala nas cenas que estão em evidência.

ROCK CITY MORGUE


Banda de funerais?!?

O White Zombie tinha em suas fileiras uma bandaça, pois o talento de Jay (guitarra), Joe Tempesta (bateria) e Sean Yseault (baixo) não poderia ser menosprezado. Com o fim da banda, cada um foi tomando seu rumo. E a baixista Sean resolveu botar pra fora o que estava entalado na sua garganta dentro do WZ – a “eletronização” do som”, e montou um grupo de acordo com suas necessidades. Ou seja: rock and roll puro e com muito sangue, vísceras e putaria juntos. Rock City Morgue, a banda, e “Dead Man’s Song” (2005), o disco, parecem ter pego o lado mais rock and roll que existia dentro do White Zombie e enfiaram punk e gótico na mistura. “Disconnected”, “No Complains” e “I Did It For You” abrem o disco naquele clima rockão básico estilo Hellacopters e Backyard Babies. Só que o negócio aqui é mais sujo, underground mesmo. Eis que na faixa-título, “Hearts”, “People Are Wrong”, “A Time And a Place”, “Dakness As Fallen”, “Never Tell Lies” e em “Don’t Leave Me Haunted” o clima muda, entra um piano mezzo fantasmagórico, mezzo blues e cabaré decadentes, e fluem influências meio góticas até. Surpreendente! “Never Ending”, “Trouble” e “Waste Away” põem o Rock City Morgue novamente a serviço do bom e velho rock and roll, com o vocalista Rick Slave soltando sua voz ao melhor estilo de um Paul Stanley (olha o Kiss aí novamente!) bêbado num boteco de beira de estrada de um deserto qualquer - o vocal do cara é algo entre o punk, o poser e o fantasmagórico. O Rock Horror Show não vai acabar se depender da loirinha Sean Yseault e sua trupe de malucos-mórbidos do Rock City Morgue.


Este zumbi habitou os pesadelos góticos dos anos 80

*Esta estranha e divertida relação de terror + rock and roll, ela vem de longa data, vide o bluesman malucão Screamin’ Jay Hawks, que foi pioneiro nesta temática (nas letras e nas suas apresentações), e que, segundo o recente livro “Goth Chic”, se trata do inventor do rock gótico lá pelos idos dos anos 50. Bom, os góticos sempre curtiram um terror B e Expressionismo Alemão, vide o Bauhaus e os tresloucados do Alien Sex Fiend (foto acima, do vocalista Nick Fiend), que assombraram as catacumbas dos anos 80. Influências nem tanto para góticos e mais para punks, psychobillies e rock and rollers, The Cramps e Misfits povoam os pesadelos de gerações que se renovam e sempre cultuam estes dois ícones surgidos na segunda metade dos anos 70. Pegando um pouco de tudo o que foi citado até aqui, o My Life With The Thrill Kill Kult produziu, no final dos anos 80, um som industrial com pitadas também de noir e easy listening, e que acabou por se tornar uma das maiores fontes de inspiração do traveco-do-mal Marylin Manson. Este último, por sinal, tratou logo de, no início de sua carreira, mostrar a origem de tudo ao gravar o cover “I Put I Spell On You” (no álbum “Smells Like Chidren”, 1995), do pai-da-matéria Screamin’ Jay Hawkins. O mundo dá suas voltas e os zumbis sempre acabam se encontrando em cemitérios e rabecões em comum.

quarta-feira, dezembro 06, 2006

SONS!!! - electro

Trabalhando pra cacete, mas não deixando de ouvir música! Acredito veemente de que seja muito melhor consultar páginas de amigos para colher dicas de sons do que confiar em colunas “oficiais” que divulgam informação processada pelos motivos de hype de sempre. Você conhece a pessoa, seus gostos e sua forma de expressar seus pontos de vista. Faço aqui minha colaboração.

THE KNIFE


Gente esquisita essa...

E meio às novas ondas propagadas pela mídia imediatista, é sempre bom atentar justamente para aqueles nomes que ficaram lá no fundo destas reportagens, meio que perdidos ou condenados por serem um tanto quanto “diferentes” mesmo. É o caso da famigerada “Cena de Estocolmo – Suécia”, atualmente o centro nervoso dos caçadores de novidades com prazo de validade curto, e que pouco deu destaque ao electro esquisito da dupla de irmãos - Olof e Karin Dreijer - The Knife. Na verdade eu só dei a devida atenção por conta de uma matéria apresentada pela minha namorada e que depois fui ligar com os toques dados anteriormente pelos meus amigos Led e Taylor. Pois bem, o tal The Knife é uma agradável e instigante surpresa! Numa primeira audição dos álbuns “Silent Shout” e “Deep Cuts” identifiquei rastros de electro-clash (aquele revival anos 00 do techno-pop/electro-funk 80’s em ritmo tosqueira e desbocado), boas doses de dark wave (sobretons góticos em formas gélidas e eletrônicas) e até mesmo um tanto de “keyboard music” (não me perguntem o que seja isso...). Olha, na verdade as interrogações piscaram aos montes no meu cérebro, pois é tudo isso que falei e bulhufas disso também! Arrisco a afirmar: trata-se de um som original, onde os vocais ambíguos (são melancólicos? São debochados? São infantis? São demoníacos?!?) de Karin dão um aspecto absolutamente único na proposta musical da dupla – isso quando Olof resolve soltar sua voz de urso pimpão sintetizado (também não me perguntem o que diabos venha a ser isso!) para bagunçar tudo de uma vez. Consegui ainda verificar batidas dançantes “normais” (na faixa dos 130 bpms), outras bem rapidinhas (160 bpms!), subgraves e cliques (nervosos!) no melhor estilo minimal, e vislumbrei o agrado numa pista de dança tanto para clubbers, rockers e góticos que queiram sacudir o esqueleto com sons nem um pouco óbvios. Ah, e ainda sobram baladas que evocam emoções ainda mais estranhas! Fora que eles já têm um DVD (imagem acima) que, pelos visuais apresentados no show, deve ser alucinógeno. Troço bom, esquisito e original este The Knife!

THE NEON JUDGEMENT




Electro por electro, é sempre bom ver os caminhos das novas gerações se cruzando com tiozinhos que andavam um tanto quanto esquecidos. É o caso do duo (Dirk Da Davo e T.B. Frank) belga The Neon Judgement, que despontou na segunda metade da década de 80 praticando um mix de cold wave, electro, gothic rock e EBM, e que parecia ter perdido o rumo totalmente nos anos 90. Eis que a turba do electro-clash anos 00 resolveu tirá-los da sombra do ostracismo e deram uma forcinha na coletânea “Box”, lançada em 2005, ao comporem os remixes do disco-bônus. Obviamente tanto a coletânea em si quanto os remixes, foi privilegiado um repertório mais voltado para bases eletrônicas toscas e programações oitentistas totalmente caricatas. Particularmente curto mais as faixas melhores trabalhadas – e que não constam na coletânea – como “Kid Shyleen” e “Chinese Black”, aquelas que justamente expõem uma face mais rica, sonoramente falando, do Neon Judgement. Sobre o disco de remixagens, sobressaem-se as versões produzidas por Tiga (“TV Treated”), Vive La Fête (“Too Cold To Breath”), The Hacker (“Factory Walk”) e Terence Fixmer (“Nion”) – todos estes apontando novos rumos e sem se apregoarem a tosqueiras propositais, pois nos outros remixes parece que tentaram ridicularizar os supostos “homenageados”. Por via das dúvidas, consulte os originais da banda, particularmente “General Pain and Major Disease” e “”Horny as Hell”.

*Saí da lerdeza de posts! Ainda tem muita coisa por vir!

sexta-feira, novembro 24, 2006

segunda-feira, outubro 30, 2006

As pedras (e algumas cabeças) vão rolar...



Comprei a Rolling Stone brasileira. Apesar de toda a desconfiança do mundo, de saber que aquela revista, retratada miticamente no filme “Quase Famosos”, atualmente (na verdade, desde os anos 80) se resvala no máximo que a cultura pop que habita e se alimenta do mainstream seja a força motriz de algo que já foi, quem diria, um baluarte do bom jornalismo musical/cultural. Pois é, apesar de tudo, eu ainda pertenço a uma geração que necessita de leitura que possa ser manuseada por meio de folhas e não somente por cliques no mouse. Porra, eu ainda gosto de levar uma revista para ler no sagrado momento da cagada matinal, por exemplo. É por esta necessidade, até mesmo fisiológica, que acabo comprando também revistas de heavy metal, mesmo não sendo muito afeito àquele universo. Eu preciso ler alguma revista!!! E a Rolling Stone tupiniquim até que me surpreendeu, tendo em vista a enorme e inofensiva placidez que reina em nossas bancas de jornal neste segmento específico.

Pra começo de conversa, a capa com “A Nossa Maior Pop Star”, Gisele Bündchen, não deixa dúvidas sobre qual universo a Rolling Stone nacional se situa: é pop, pop e pop! A matéria, propriamente dita, é um embuste sem conteúdo algum, mas também um tiro inicial certeiro para atrair compradores que englobem tanto uma senhora dona de casa e leitora de Caras, quanto um senhor quarentão nostálgico e ávido por boa leitura musical/cultural que ficou perdida em algum lugar dos anos 70 (e que deve viver sonhando em “dar um trato nessa Gisele aí”). Chamadas na capa com hypes tipo Franz Ferdinand e todas aquelas bandas novíssimas com “The” no nome, e pronto: chama-se a atenção também para a “geração web”, sedenta por downloads rápidos e informações rasas. Já entraram em campo com todos os goleadores no time titular, chutando para os dois gols ao mesmo tempo, querendo agradar a todas as torcidas e acreditando na classificação final por goleada. Some-se o altíssimo poderio que a matriz norte-americana possui para rechear as páginas com exclusivas de artistas hollywoodianos e tem-se uma revista em ponto de bala para reinar no seu segmento, certo?

A comparação com a versão atual da Revista Bizz é inevitável. Pois a nova Rolling Stone brazuca repete matérias e resenhas com artistas que são figura cativa nas páginas da publicação da Editora Abril. As seções fixas de ambas se parecem muito, inclusive. Mas a Stone nacional deixa a Bizz no chinelo por uma mera questão quantitativa. Ao oferecer quase o dobro de páginas e em tamanho maior, nossa filial brasileira disponibiliza, enfim, um conteúdo um pouco mais detalhado e que faz fixar o leitor na revista por um período que seja maior que o de uma hora – que é o tempo médio gasto para consumir a Bizz de cabo a rabo. A mesma Bizz insiste em tentar agradar à “geração download” disparando matérias superficiais com artistas de carreiras superficiais, construindo lindas peças de editoração gráfica (estariam eles querendo abocanhar algum prêmio nesta área?!?) e oferecendo muito pouco do que fora prometido em sua volta: “textos mais profundos e informações exclusivas”. Qual informação é exclusiva a uma publicação de papel se a web fornece tudo mais adiantadamente? E que textos estes que são tão profundos assim se a revista perde a maior parte de seu espaço total com matérias não maiores que uma página - quando muito? A Bizz só gasta um pouco mais o nosso tempo com matérias um tanto quanto aprofundadas ao abordar nomes/fatos do passado (residem ali, admito, algumas excelentes reportagens), enquanto que patina abobalhadamente quando tem de escrever sobre algo mais recente.

Nossa Rolling Stone, já sabem os bem informados, pretende ser algo aqui da mesma forma como ela já é - e não o que tenha sido - lá nos States: uma mídia extremamente mainstream, com algumas pitadas a mais neste segmento. Estas pitadas a mais vieram em forma de boas matérias como a sobre o Acre e a do PCC (da Redação nacional), e as que enfocam as personalidades de Jack Nicholson, Bob Dylan e Daniel Pichenback (uma espécie de “guru psicodélico” dos tempos atuais) – todas estas últimas produzidas pela matriz norte-americana. Apesar de haver uma preocupação em manter equilíbrio entre a quantidade de material gringo e nacional, os nossos representantes locais deixaram a desejar nas matérias sobre Brasília (muita opinião, mas pouca apuração de fatos propriamente dita) e demais micro-entrevistas (não acrescentaram nada além do que você já leu bem antes na internet). Fora que a linguagem utilizada parece querer se comunicar globalmente, transparecendo um certo ranço superficial tais quais são os textos, por exemplo, de Sérgio Martins (que, acreditem, já foi editor da Bizz!) sobre música na Veja. Uma coisa que eu não esperava de nossa Rolling Stone, mas que fora alardeado aos quatro ventos pela Bizz, acaba faltando em ambas: ousadia! Isto, até a extinta Zero (lembram-se dela? Foi há tantos anos...) tinha mais a oferecer quando realizou matérias interessantes, como as experiências in loco com ácido lisérgico no Centro de São Paulo, e entrevistando personalidades tão distintas como Serginho Chulapa, Bozo e Negreti (o ex-baixista da Legião Urbana, que deve ter tomado umas para entregar tantos podres, de uma vez só, sobre o maior culto do pop/ rock brasileiro de todos os tempos).

A Rolling Stone brazuca não ladra por aí que quer ser ousada. A Bizz late, late, mas não morde ninguém – a minha mais recente decepção ficou por conta das “Dez histórias que os fãs não gostariam de saber sobre Renato Russo”: prometeram “ousar” e mexer num vespeiro, mas apenas fizeram o básico para garantirem grandes vendagens em cima de um mito inabalável. Por essas e outras que acredito que a nossa Stone vá engolir por total a “concorrente” Bizz. É como um grandalhão forte e dono de uma empresa cheia de investimentos em dólar querendo tomar o lugar de um indie nerd e magricela, que depende da mesada dos pais (leia-se: Editora Abril) para se manter. Nas bancas de jornal, aqueles conteúdos de cultura pop que realmente fazem a diferença incoerentemente residem em publicações que não se anunciam como residentes deste universo, tais quais algumas ótimas reportagens em publicações como Trip, Playboy, TPM (a única revista feminina que não é machista nem panfletária!) e até mesmo Fluir. Todas estas revistas são voltadas para um público mais adulto, mais maduro como elas afirmam. A Bizz parece ser tocada por trintões que estão perdidos num espaço-tempo que varia entre resgatar o passado que não viveram e correr atrás do que os mais novos conseguem com muito mais rapidez por meio de um clique virtual. Já a nossa Rolling Stone, em seu primeiro número, faz tudo isso e mais um pouco – com muito mais páginas! Pelo preço de capa das duas (a Stone é 1 real mais barato), presumo que a Bizz esteja com seus dias contados e que seus colaboradores devam mesmo é estar sonhando com a estabilidade dos dólares de Tio Sam que pairam sobre a redação da Stone brasileira.

*Apesar de tudo o que escrevi, vou continuar comprando estas revistas. Elas ainda me são bastante úteis e conseguem me arrancar algum prazer. Mas tenho que sentar o ferro na boneca, pois satisfeito eu não me encontro!

*Ainda penso que os melhores textos e reportagens residem por aí no meio de comunicação mais democrático de todos os tempos: a internet. Mas ela ainda não é tão acessível (paga-se, ainda, um preço bem salgado por uma conexão decente), tem de se filtrar muita, mas muita coisa para se chegar a um resultado satisfatório, e simplesmente não dá para levar o computador para o banheiro na minha cagada matinal!

terça-feira, outubro 17, 2006

A Bala Eletrônica


Mais terror flúor na área!
Foto by Kalunga


Quando se fala em música eletrônica aqui no Estado atualmente, a “cena” local resume-se praticamente ao furacão da moda do psy trance e uns gatos pingados fãs de house, electro e Prodigy perdidos por aí. É incrível saber que a maioria esmagadora do público que freqüenta as raves psicodélicas de hoje nem sabia da existência de uma história anterior aos últimos três anos de bombação fluorescente. Sorte a desse povo, que não teve que sujar os pés na lama primordial do surgimento desta tal “cena”. Meus amigos, mas rolava cada roubada que nêgo hoje não tem nem parâmetro para medir o altíssimo nível das produções atuais com o samba-do-raver-doido que pairava amalucado até o ano de 2003. Neguinho atirava para tudo quanto é lado. Pintou aí até uma bala eletrônica que fez gente rolar no chão – no mau sentido!

O dono da festa tinha idéias mirabolantes. Malucão de carteirinha, veterano em pirações de acordo com o que lesava os incautos e onipresentes de frases de efeito (retardado...) tipo “pô, mó viagem!, o tal cara já havia investido em boates com surf music australiana (isso foi moda por aqui no final dos anos 80), apostou pesado em rocks baseados na onda regueira, e no final de 2003 encontrou o nicho perfeito para pirar o cabeção: as raves! Ele era dono de uma empresa de iluminação, o que já era garantia de um evento com boa produção neste quesito. Mas o mesmo também comercializava fogos de artifício (!), e queria utilizá-los a pleno vapor no momento da festa. Para completar a viagem, ele já havia batizado o nome da “rave”: Electro Bullet (“Bala Eletrônica) – sua intenção era criar uma empatia imediata com a malucada que já abusava de bala (gíria tupiniquim para a droga sintética ecstasy) e que poderia aderir à temática da festa mais facilmente. Porém, a idéia dele era de “reunir tribos”, e por isso escalou um line up totalmente diversificado: Sybel (minimal house), J3 (hip-hop), Guga Prates (progressive house), Léo Santos (tech house) e o Kalunga aqui que vos escreve. Diversos estilos musicais diferentes, fogos de artifício, festa “temática” (“bala eletrônica”, lembrem-se!!!) e um local supostamente alucinante... Sobrou confusão!

Pois é, o tal “local alucinante” se tratava de um enorme terreno descampado, localizado nos confins da Barra do Jucu, com muito barro, lagoas de pesque-e-pague, um campo de futebol, uma única choupana (se chovesse, já era!) e enormes paredões que receberiam projeções de luz. Fomos lá, eu e os outros DJs, dias antes e constatamos que o lugar era, no mínimo, “diferente”. Fosse um grande festival de rock, tipo com umas 15 mil cabeças, faria sentido àquela enormidade toda. Não foi bem isso que aconteceu... Mas o legal é que nós, os DJs, fomos ouvidos o tempo inteiro, recebemos tratamento vip até o dia do evento e, acreditem, recebemos cachê com três dias de antecedência! Explica-se: o dono da festa tinha a maior fama de malucão. Com o próprio tendo consciência de sua reputação, tratou logo de nos assegurar de que nada sairia de errado. E o figura não inspirava muito crédito não, tendo em vista o fato dele sempre acender baseados enormes e soltar fogos de artifício (?!) em todas as reuniões que tivemos. Ele sacou isso e colocou grana na nossa mão adiantadamente. Demos o devido crédito - com o bolso cheio, todo mundo fica feliz – e fomos para a tal Bala Eletrônica.

Primeiro erro: a escalação absolutamente eclética, que não rendeu a aceitação que o dono da festa esperava. Tantos gêneros musicais distintos já se segmentavam, cada qual em seu nicho, e todos reunidos numa só festa não atraíram tanta gente assim. Das duas mil cabeças esperadas, devem ter ido umas 150, 200 no máximo. O psy trance popularizava-se a plenos pulmões e a festa “rave” deveria ter se fechado neste estilo pois, ao final de tudo, quando fui tocar (era o último, por ter um “som mais pesado”), o negócio descambou para um fight club no sentido literal da palavra... Segundo erro: o local. 150 pessoas num lugar onde cabiam 15 mil, daí vocês tirem suas conclusões sobre os espaços que sobraram. E o terceiro erro quem provocou... fui eu mesmo!!! Fogos de artifício, balas eletrônicas nos cérebros das pessoas, e um irresponsável que resolveu apagar fogo com gasolina no final de tudo. Olha, a minha sorte era que todo mundo ali estava maluco demais para tentar localizar o verdadeiro culpado daquele fim de festa sinistro, hehehehe...

O que rolou foi que, ao longo da noite, nenhum DJ/músico conseguiu fazer uma pista de dança. O público estava disperso, bebericando e fumando vários pelos cantos. Uma metade foi-se embora gradativamente. A outra metade, camisas-flúor de carterinha, esquentava as turbinas sob os efeitos da tal “bala eletrônica” (que fora comercializada em paralelo aos ingressos da festa) na espera pelo batidão psy e tomando altos tapas com os buscapés brilhantes que eram soltos no meio deles – falta de noção total, pois eu vi gente saindo correndo alucinada e apavorada dos tais rojões. Tentando segurar esta galera na festa, o organizador foi adiantando os sets dos outros DJs para que eu tocasse o tão esperado psy antes do amanhecer. E neguinho estava ficando nervoso – muitos trincando os dentes, querendo logo um trance nas caixas de som. Todos os que tocaram antes de mim não puderam ter seus trabalhos devidamente valorizados na pista, e era fato de que o público para o qual eu tocava naquela época azucrinava todo e qualquer DJ para que acabasse seu som para começar o psy trance logo. Pois bem, finalmente comecei a tocar e, depois de meia hora, a confusão começou a rolar.

O dono do local da festa encheu o saco e resolveu acabar com tudo tão logo havia chegado o amanhecer. Mas tinha uma galera pra lá de pilhada que não arredaria o pé dali antes do meio-dia. Iniciou-se um bate-boca entre organização, proprietários do local e donos da equipe de som. E eu mandando ver no trance, nem aí para aquele rolo todo. Eis que alguém desliga o som do PA. Como o som do retorno do palco não fora desligado, na mesma hora eu gritei: “Aí galera! Vamo subir no palco e quebrar tudo!! Não vamos deixar a festa acabar não!!”. Só sei que todo mundo subiu no palco, o chão começou a tremer, o dono do lugar estava falando que iria puxar uma arma da casa dele... e o som foi desligado de vez! Daí começou um bate-boca (mais um!) entre o público e a galera do outro bate-boca, neguinho pilhado, travado ou sei lá mais o quê. Uma menina pra lá de exaltada começou a apontar o dedo na cara do dono do lugar, o cara respondeu à altura, a mina deu um soco na cara do sujeito, os dois rolaram no chão, o troço virou um porradeiro generalizado, com mais mulher do que homem, todas batendo de mão fechada, e marmanjo apanhando bonito das meninas!

Nisso o meu cd que estava tocando por último ficou preso dentro do CD-J desligado. Ameacei levar o aparelho comigo se não me devolvessem o cd (uma porra de um simples cd-r!). O Rike e a Dessa, que foram à festa somente para se divertir, tentaram me acalmar: “Kalunga, seu louco! Vamos embora daqui o mais rápido possível!”. E eu ainda queria a porra do cd-r (não custava mais que 1 real...) que estava preso dentro do aparelho. No final das contas, combinei com o próprio dono do equipamento de me dar uma carona e ligar o CD-J longe dali, paraque eu finalmente pegasse meu querido cd-r. Já distante do porradeiro, a Dessa percebera que o Rike estava lá no meio e foi desesperada atrás dele. Todos devidamente instalados na carroceria de uma Fiorino, fomos embora o quanto antes, cruzamos com viaturas no caminho e deixamos aquela galera se comendo na porrada pra trás. A moral desta história foi que o episódio marcou o fim de uma era da qual a música eletrônica ainda significava o “moderno”, e que todo mundo queria cair de pára-quedas naquela onda. Hoje, para alguém se meter a produzir uma rave, tem que ter bala (eletrônica! hahahahaaha!!!) na agulha, investir somente no psy trance, esquecer das misturebas, apostar sempre mais do mesmo e sem arriscar, e nem saber que um dia as coisas já foram mais difíceis e engraçadas também. E o melhor de tudo é lembrar de uma roubada da qual eu, pelo menos, saí com o bolso cheio!!

segunda-feira, outubro 09, 2006

Me indicaram!


Este cara morreu produzindo música boa até o fim

Me indicaram!

Pessoas e fatos passam pela sua vida a todo instante, e alguns poucos são dignos de nota no seu cérebro. Penso o mesmo sobre música. Indicações ocorrem aos montes, e muitas vezes um som que mudou a vida de um amigo próximo seu pode lhe despertar a mais profunda indiferença. Porém, é sempre bom dar ouvidos às indicações, mesmo que exista a suspeita de que o negócio não vá provocar impacto algum – o que não foi o caso aqui. Estes três sons a seguir mexeram comigo, cutucaram no meu cérebro, e estão devidamente guardados na minha lista.

O punk rock, quando do seu surgimento, era a coisa mais urgente e “tapa na cara” que existia. O que poderia acontecer quando os ícones desta facção sonora envelhecessem? Afinal de contas, eles – os punks – vieram também para varrer as gerações anteriores junto de seus vícios. Era o futuro - ou no future, como cuspia Johnny Rotten. Mas como esta geração se comportaria fazendo parte de um passado já distante? Muitos deles acomodaram-se em carreiras e barriguinhas salientes de formas tão idênticas quanto os próprios dinossauros que eles clamavam por extinção. Tornaram-se aquilo tudo que criticavam. Vejo o mesmo acontecendo com alguns ícones da música eletrônica que vieram nos anos 90 arrombando as portas e empurrando o que havia de estabelecido na época para o parque jurássico dos acomodados em geral. Porém, do meu parco conhecimento no terreno do punk rock, sempre que a palavra "The Clash" era citada, surgiam na minha mente músicos que desafiaram seu tempo e que sempre apontavam suas carreiras para a evolução. O que meu amigo Paulinho Ramone já me mostrou destes caras não era brincadeira: em meio ao minimalismo sonoro propagado pelos punks, o Clash estreitava as relações com a Jamaica, fuçava o rockabilly e, de vez em quando, concatenava com até com o jazz e o ska. Seria uma banda à frente do seu tempo ainda hoje!

Eis que, na quebradeira ocorrida sábado retrasado, quando da ocasião do aniversário do Mentor, rolou por intermédio de Caio o disco-solo do ex-Clash Joe Strummer e sua banda The Mescaleros. Em meio a bebidas destiladas em doses fartas, cerveja em copos de 500 ml e muita fumaça, o dub incrivelmente maravilhoso de “Get Down Moses” penetrou na minha mente sem pedir licença, bagunçou meus neurônios e me deixou hipnotizado naquele divertidíssimo caos do momento. Baladas ao violão e punks de veia country também me deixaram embasbacado com aquele disco. Naquele momento meu cérebro não tinha muitas condições de tecer considerações mais profundas, mas fiquei com aquela pulguinha atrás da orelha. Eis que, fuçando um cd de mp3 presenteado pelo Mr. Lips (made in Colatina/Hell’s Kitchen) em 2003, estava lá o tal álbum do Strummer. Definitivamente o falecido tiozinho do punk rock cometeu ali um disco para marcar época e deixar o seu legado para futuras gerações. Faixas como “Coma Girl”, “Arms Aloft” e “All In a Day” jorram adrenalina e suas melodias e soluções harmônicas (que porra de banda é o The Mescaleros?!?) estabelecem marcas definitivas no seu cérebro. A voz de punk envelhecido de Strummer parece reverenciar Johnny Cash nas belíssimas baladas “Long Shadow”, “Silver and Gold” e “Ramshackle Day Parade”. Rocks que parecem ter saído de botecos de beira de estradas poeirentas perfazem também um tanto de melancolia em “Midnight Jam” e “Burnin’ Street”. E ainda há uma linda versão de “Redemption Song”, do Mestre Bob Marley. Enfim, trata-se de um clássico contemporâneo. Joe Strummer produziu este último suspiro de consistência e profundidade antes de falecer.

Outro dia rolou uma discussão muito bacana com meu amigo Taylor, sobre o fato da geração atual de auto-proclamados indies não buscar referências musicais que tenham vindo antes dos anos 2000, de simplesmente ignorar a existência de, pelo menos, duas ou três gerações de bandas do dito rock alternativo, da frustração de tocar (na verdade, fui eu que fiz isso) um hit manjado de 1996 do Suede e o público simplesmente não saber (e nem querer saber) o que era aquilo, e que tudo isso acabou por fazê-lo perder o tesão de batalhar por pistas de dança menos óbvias e mais informativas. Na mesma discussão eu pude, de certa forma, comemorar o fato de que boa parte do público mais novo que freqüenta a minha festa gótica-industrial The Dark Street Project caça as novidades ao mesmo tempo em que se mantém informado sobre o que veio antes. Pelo menos a galera que curte EBM/industrial é assim, enquanto que os “góticos” em sua maioria só dão trela para coisas tipo gothic metal e adjacentes. Pois foi de uma galerinha bem nova (não deviam ter pouco mais do que dezoito anos) que conheci a pedrada sonora chamada Combichrist. Esta mesma turma veio olhar meus CDs e pirou com o fato de eu ter todos os discos do Nitzer Ebb originais, e acabaram por pedir para tocar o clássico “Join in the Chant”. No mesmo ato eles me indicaram a ouvir o tal Combichrist. Não conhecia e fui correr atrás. Trata-se de um projeto paralelo de Andy Laplegue, do cultuado grupo de future pop Icon of Coil, e foi criado para resgatar as bandas na linha powerfull-industrial-ebm de gente como 1.000 Homo DJs e o citado Nitzer Ebb, com batidas eletrônicas estilo bigorna, sintetizadores rascantes e muita distorção digital. O primeiro álbum, “Joy of Gunz” vai bem nesta linha distorcida até o talo. Porém, os caras poliram o som e, pelo menos nos EPs “Get Your Body Beat” e “Sex, Drogen & Industrial”, cometeram atos de EBM e industrialismos dignos de clássicos como “Headhunter” Front 242) e “Let Your Body Learn” (Nitzer Ebb). O Combichrist reverencia o passado de forma respeitosa e ainda atualiza o som com pegadas de techno e hard trance. Batidão pesado, travado e com palavras de ordem para gritar na pista de dança!

Quando fiz um post sobre o She Wants Revenge, o colega virtual Doggma comentou sobre o som, afirmando que lembrava um pouco o Bella Morte. Fiquei instigado. Sabe aquele som que você acha que conhece, mas nunca deu a devida atenção? Pois é, eu só tinha uma música desta banda e fui atrás para ver conhece-la melhor. O link com o hypado SWR é real, pois há uma semelhança entre a bateria eletrônica minimalista e os sobretons góticos de ambos. Mas o Bella Morte é mais atual, não se prende rigorosamente a um passado específico como o SWR faz com Joy Division (principalmente) e Depeche Mode dos primórdios. As guitarras são mais sujas, as melodias vocais são mais rasgadas e há uma conjugação pertinente com sons góticos atuais. “The Quiet” é o meu álbum preferido do Bella Morte, principalmente pelas faixas “Logic”, “Whispers” e “Always” (mais eletrônicas), “Living Dead”, “Echoes” e “Chistina” (mais heavy metal, guitarras apitando, refrãos cantaroláveis), e “Ember” e “Wires” (boas baladas neo-góticas).

*A quem interessar, existe um novo projeto semanal de música eletrônica aqui em Vitória: Projeto Makina

Estamos remando contra todas as marés possíveis, mas o negócio está engrenando!

Valeu!

quinta-feira, setembro 21, 2006

Dark Street Tour em BH Rock City


As Brumas de Outono se encontraram na Dark Street
Foto By: Kalunga


Mineiro é muito gente fina! Não é de hoje que meus amigos me falam isso, dos famosos rocks em Bêagá, de boa comida, papo bom, cerveja boa, farta e sempre gelada, uai! Papo tão bom este que rendeu convite para fazer minha festa The Dark Street Project na Terra do Pão de Queijo. Porra, pão de queijo! Tinha que comer um logo quando pisasse nas Minas Gerais, mas ficou pra depois. Pois é, quando pisei na capital das Gerais o visual até me lembrou São Paulo: muita ladeira, céu poluído, trânsito infernal, ar seco... Rapaz, as semelhanças acabam por aí e lendo o texto vocês saberão o porquê! Cheguei às 18 horas de quinta-feira, hora do rush, com o Angel e sua mulher já me esperando na Rodoviária, e fomos pegando busão lotado (linha 1407), estilo Transcol, para a casa do Nilton, nosso cicerone – que por incrível coincidência encontrava-se no mesmo coletivo, voltando de seu trabalho. Já devidamente instalado no apê em São Francisco, rolou aquele banho providencial, passamos rapidamente para conhecermos a Casa Matriz (espaçosa, underground, com toda a estrutura – tudo isso junto nunca existiu no ES!), e partimos para o principal: cerveja! Cerveja esta que está sempre boa, farta e gelada!

A primeira cerveja boa, farta e sempre gelada rolou um barzinho na Savassi: cadeiras na calçada, lotado de gente de todo o tipo, tomamos Heineken em um linda e verde garrafa de 600 ml – nunca tinha visto!, comemos uma porção de 10 pastéis a R$ 2,50 (lembrem-se: a porção!), e começamos a perceber que tudo em BH é mais em conta que em Vitória. Estão vendendo uma imagem exagerada de “qualidade vida” que na verdade está encarecendo tudo na nossa Ilha-Província-Capixaba. E olha que estávamos na Savassi, a Praia do Canto os belorizontinos, pagando barato para beber bem, cerveja sempre gelada – porra, como é difícil tomar uma cerva nos trinques aqui em Vitória! E com os neurônios nos trinques que fomos panfletar a nossa festa em locais como A Obra e Up Club – locais pequeninos, no meio termo entre o charmoso e o tosco. A fome e o cansaço batendo, e lá fomos nós para o Centrão, forramos o estômago na tradicional cantina italiana La Greppia, 30 anos de história, aberta e lotada 24 horas, R$ 8,90 pra comer uma variedade deliciosa até cair. Só não rolou pão de queijo! E caímos de sono, pois no dia seguinte tinha mais.

O dia seguinte teve muito mais, pois fomos ao Mercado Central, mil comidas, temperos, cachaças, mais cervejas geladas e nos trinques. Comemos Comida Mineira (com maiúsculo e autoridade!) legítima no Casa Cheia, que fica no mezanino do Mercado. Rapaz, até a couve refogada deles é de uma divindade única! Da divindade para o inferno, pois tivemos que andar na rua torrando com 38 graus de um sol atípico (segundo os próprios mineiros) na moleira, tontos de tanto comer, e sem podermos dar mole de pedestre capixaba: quem anda a pé em BH não vale um tostão, pois o trânsito ali é dos velozes e furiosos. E fomos, velozes e furiosos, no Gol do Nilton, pegamos o brother Tatá (o cabeça do movimento gótico de BH, quando bêbado, parece um urso amigo e emotivo – figuraça!), e a dupla Fábio e Ricardo, da banda Lost Days (que iria tocar conosco – mais figuraças!) e partimos para darmos seguimento à saga de divulgar nossa festa em programas de rádio e de televisão. Da UFMG (cheia de histórias de estupros e assassinatos) à PUC, suamos a camisa (literalmente!) e cumprimos nosso papel. E partimos para a cerveja boa, farta e sempre gelada, desta vez no Maleta, um pico no Centrão, parecia até a Rua da Lama, com vendedores de cd pirata, amendoim, hippieces, mendigos... e com o que a nossa Lama produz com dificuldades: a porra da cerveja boa, farta e sempre gelada – Original na cabeça! Cabeças as nossas já meio lesadas, mas fomos para outro lado da cidade, num bairro mega-granfino chamado Belvedere, tudo isso para tomarmos um chopp divino no Krug Bier. Puta que pariu! A espuma daquele chopp (um de trigo, meio turvo e mais forte que todos) é alucinógena. E ainda rolou um vira-vira de tequila no final - R$ 6,50 a dose de Jose Cuervo Ouro, num bar, pasme!, numa área tipo Ilha do Frade... porra, capixaba paga o dobro nisso, e ainda não come pão de queijo decente, sendo que eu ainda não havia comido um!

Se ainda não rolou um pão de queijo, rolou uma gripe chata que veio com tudo pra cima de mim, como que uma punição por ainda não ter experimentado essa guloseima típica mineira. Arrastando carcaça, fomos novamente para a Savassi, onde fizemos um pit-stop no Bar do João, e depois fomos a uma galeria onde ficava uma loja de moda gótica e um stand de piercing e tattoo. Neste último, conhecemos o Johnny, veterano da galera que curte e produz som e festas no estilo EBM/industrial – era O Cara, pois sua banda, Cadaveria, era um mix de Ministry com Young Gods cantado em português! O bagaço da gripe me assolava, a fome idem, e acabei comendo num restaurante natural (Casa Natural) maravilhoso, enquanto que Tatá, Nilton e Angel foram se acabar num (mais um!) restaurante de Comida Mineira (maiúsculas, lembre-se!). Da comida para a cama, pois a noite era de festa. Festa Gótica!

A Festa Gótica – organizada pelo núcleo Brumas de Outono – em si não vingou o esperado. A enorme divulgação que saiu nos principais jornais de lá (Estado de Minas e Diário da Tarde), com fotos grandes e entrevistas, parece que rendeu inveja em outros núcleos semelhantes – e eu que achava que este tipo de coisa era privilégio de nossa grande cena capixaba. Não quis nem saber, toquei com vontade, fiquei de pé à base de vodka com energético e tudo de bom aconteceu. Estiveram presentes cabeças boas e influentes, que abriram as portas para que tocássemos quando quiséssemos em BH, e ainda por cima rolou um canal do caô aqui poder ter a chance de discotecar na Thorns – a maior rave gótica do país! Quem botou esta pilha foi a dupla do Lost Days, banda que mistura gothic rock e EBM, que fez um show destruidor na nossa festa, e que bebe pra caralho!!! Os dois figuras, lá pelas tantas, me revelaram o que o adjetivo pós-punk se transformou para eles. Era algo tipo o nosso capixabasso, hehehehehe... Só sei que no final eu já estava pós-punk decadente da porra, uai!

Decadente da porra no domingão e ainda não havia comido pão de queijo! Fome batendo e fomos nós na Savassi atacar um restaurante chinês do qual não me lembro o nome (excesso de shoyu na cabeça e na pança...) e que cobrava R$ 13,00 por cabeça para comer de tudo muito bom e sem parar. Em Vitória um restaurante desses iria dar briga, seria depredado, não daria certo, muito bom pra ser verdade. Verdade mesmo era tocar fundo para a Praça da Liberdade e seus bebedouros de água gelada, gente de todo o tipo em perfeita harmonia num Domingo no Parque mineiro, uai! Bagaço batendo mais forte, e nada do pão de queijo! Chegava a hora de arrumar as malas e ir embora. Bicho, ô terrinha de gente boa da porra! Não moraria lá, mas que voltarei sempre, isso com certeza! E o pão de queijo? Comi quatro de uma vez só, momentos antes de embarcar para Vitória. O pão de queijo de rodoviária deles faz o melhor dos nossos parecer borracha com goma de mascar. Acordei já em Vitória, meio perdido, chumbado e feliz. Quero voltar, uai!!!!

+ Fotos:
By Kalunga


DJ Angel (ES), meu parceiro na Dark Street, foi devidamente 'montado' pra festa. Sinistro...


Já pedindo arrego e água, junto com Fabio Riot, guitarrista do Lost Days (MG) e pós-punk pra caralho, hehehehehe...


Entre Nilton, nosso anfitrião, cicerone e faz-tudo de BH, e o Tio Chico


A banda Lost Days quebrou tudo no seu show!


O caô aqui pode dizer agora que já botou som em BH, hehehehe...
*Esta foto by Led Russo

quarta-feira, setembro 13, 2006

Sem contra-indicações... e sem qualquer indicação


As referências eram equivocadas. Eles eram estranhos no ninho podreirão da Earache

Tudo é mais fácil quando você lê algo numa revista ou jornal com aquele selo discutível de qualidade, normalmente adotado por críticos musicais que soltam pérolas como: “banda essencial”, “discoteca básica”, “compre, roube, mas não deixe de ter este disco”. Você vai lá, confiando nas palavras de alguém que, supostamente, sabe bem o que está falando e o óbvio acontece pois, afinal de contas, quando um senso comum compra a idéia de que determinado disco/banda é de qualidade, foi realizado todo um processo de análise coletiva para se chegar a tal conclusão. Bom, eu sempre procuro minhas próprias fontes – ou seja, meu gosto pessoal! - para poder comprar a idéia de que tal disco ou banda sejam mesmo imperdíveis. Normalmente este tipo de categorização envolve álbuns que possuem, no mínimo, 20 anos de idade – tempo seguro para que sua importância seja esmiuçada até que se chegue num consenso – apostas assim em fatos recentes são deveras arriscadas, certo?

Mas será que você só compra um disco de acordo com determinados certificados de qualidade, ou acaba apostando num som seguindo seus próprios instintos, sabendo pouco ou nada sobre o referido artista, correndo o risco de querer jogar a bolachinha na privada posteriormente? Eu acredito que certos riscos na vida são de grande valor pessoal, mesmo que você dê com a cara no muro. No caso de um cd, o risco é financeiro e de alguns neurônios gastos com mau humor momentâneo. Porém, quando você acerta o alvo sem qualquer tipo de orientação, o sabor da vitória infla teu ego maravilhosamente bem. Existem alguns disquinhos aí que eu simplesmente atirei no escuro, alguns de bandas das quais eu nunca havia lido ou ouvido nada a respeito, tendo comprado o disco pela capinha, pelas indicações equivocadas ou simplesmente por engano.

*Este texto, obviamente, não se enquadra na Era da Internet. Quase ninguém mais compra discos novos (sebos são outra história), e uma curiosidade momentânea é saciada com um clique no mouse. Ou seja, esta prática descrita neste post pode se considerar extinta.

Sempre ia à loja de discos Tarkus com uma listinha básica de cinco a dez discos para encomendar na gringa. O dólar baixo (R$ 1,20!!) me fazia torrar o salário com sons e mais sons que nunca teriam chance de serem lançados aqui no Brasil. Com o tempo fui sabendo que certos selos eram casa garantida de bandas de estilos musicais que curtia ( Wax Trax!, TVT, Metropolis, Alternative Tentacles, Antler-Subway, Play It Again Sam à frente), e dali partia para novas investidas em seus catálogos. Porém, uma resenha pequenina na Rock Brigade me deixou intrigado: “Uma sensacional mistura de Prong, Living Colour e Biohazard" - sendo que a gravadora em questão era a famigerada Earache, pródiga no lançamento de podreiras death metal e adjacentes, o que me fez estranhar totalmente, apesar das boas indicações. Deixei lá pro fim da lista, e numa determinada encomenda lembrei-me do tal disco e fiz o pedido, mais para tapar buraco, junto de outras três bandas das quais já conhecia e completava suas coleções (Lard, Butthole Surfers e Skinny Puppy). O tal grupo se chamava Dub War – nome bastante sugestivo! Quando finalmente dei a devida atenção à bolachinha, meu cérebro travou: CARALHO!!! O que eu ouvia ali era como se o Bad Brains fosse transposto aos anos 90 (o ano era 1997), carregando no raggamuffin e em vocalizações de deixar Mestre Bob Marley orgulhoso, tudo isso sobre uma base instrumental moderníssima que ía do reggae ao metal sem frescuras, com o dub invadindo todos os poros do cd de forma achapante. Simplesmente todas as músicas de "Pain" – o referido disco – grudaram na cabeça instantaneamente, me fazendo imaginar o som desta banda maravilhosa invadindo o dial da extinta Maldita FM capixaba e virando hit local (que viagem a minha...). O tal disco virou mania entre diversos grupos diferentes de amigos meus, incluindo aí uma zaga de Guarapari e de BH. Tratei logo de encomendar as maravilhas de "Enemy Maker" (a faixa título é maravilhosa!) e "Wrong Side of Beautiful", mas os mesmos haviam saído de catálogo. Veio a internet e acabei por completar sua discografia. E pensar que a resenha da Brigade não deu pista alguma (talvez o Living Colour fosse uma referência acertada), o histórico de sua gravadora depunha contra, e o acaso – o mais puro acaso! – me fez adqüirir o som de uma das minhas bandas preferidas de todos os tempos.

*Max Cavallera também pirou nesta banda, e por isso convidou o vocalista do Dub War, Benji, para participar de duas músicas do disco de estréia do Soulfly – que, por sinal, são as melhores do álbum...
**O Dub War acabou e voltou reformulado (trocou o baixista) sob o nome de Skindred. Baixaram as afinações e entraram de cabeça no nu metal. Mantiveram os dubs, raggas, e refrãos grudentos, enfiaram um peso absurdo e ainda mandam no pedaço – ainda que continuem injustamente semi-desconhecidos. Possuem apenas um disco homônimo, e aguardo como a vinda de Jah por um novo lançamento.

Numa enésima visita à mesma Tarkus, eu sempre perguntava ao Beto (dono da loja) se tinha alguma coisa nova ali que fosse do meu gosto. ”Ah!, Tem um disco lá em cima que veio por engano e acho que de repente você poderia gostar” – e veio ele com uma banda de nome meio impactante e com uma credencial de peso: a produção em conjunto de Trent Reznor (Nine Inch Nails) e David Oglive (Skinny Puppy). O visual sugeria algo entre o glam rock e o gótico, e levei pra casa sem nem ouvir direito – pela primeira impressão, parecia bom. Pois bem, “Portrait of an American Family”, primeiro disco do, até então, semi-desconhecido Marilyn Manson até que me surpreendeu, com sua consistente mescla de glam/hard rock com industrial e reminiscências góticas. Passados alguns meses, o cara virou astro da MTV com o disco “Antichrist Superstar” – discaço!, mas eu até hoje curto mais o primeirão dele. Coisa de ego mesmo, sabe como é, descobri primeiro, hehehehe... e quase ninguém conhece este disco até hoje! Ouçam, pois vale à pena.

*Acompanhei o Marylin Manson até o “Mechanical Animals”, e depois perdi o interesse por achar que sua fórmula havia se esgotado, além de ter se transformado em terror norte-americano pós-adolescente ao estilo Wes Craven. Pois é, outro dia me mostraram umas três músicas de seu último disco e caí pra trás. Este lambisgóia horroroso – digam o que for dele – sabe compor boas músicas!

Pois é, este post poderia se chamar “A Tarkus e a Minha Vida”, pois lá vou eu citar esta loja novamente. No caso, foi quando saí de lá de um sábado à tarde com o disco "Aenima", recém-lançado, do Tool. Já conhecia o disco anterior deles, “Undertow”, tinha uma fita gravada e tal, sendo que a mesma ficara encostada em algum canto – resumindo: não dei a devida atenção. Pois bem, fui à loja com o cérebro lotado de THC (chegar lá assim só me deu prejuízos...) e quando vi a capinha holográfica de “Aenima” na loja, falei: “isso aqui parece ser bom!”, e na hora nem tive a capacidade mental de fazer a ligação de que se tratava da mesma banda da fita K7 esquecida. Cheguei em casa, ainda chapadão, e botei pra rodar o negócio. Os primeiros abalos sismicos de “Stinkfist” foram me afundando na cama, e o dia foi anoitecendo, as músicas ficando mais longas e intrincadas, a onda não passava e... fiquei viciado em Tool para sempre! Só que esta banda não colou com ninguém que mostrei (isso foi há quase dez anos atrás), e acabei por me recolher naquele maravilhoso universo sozinho. Depois fui encontrando gente que era tão maluca nesta banda quanto eu, e até amizades surgiram disso!

*Vale lembrar que no Brasil as poucas resenhas que saíram do Tool até o “Aenima” detonaram a banda. As indicações eram as piores possíveis.
**Não venho levantar bandeira alguma aqui sobre este assunto, mas enfatizo o uso do THC apenas para uma coisa: ouvir música! Sua percepção aumenta e suas emoções afloram – e isso eu endosso. Sobre os demais usos desta substância, acho tudo um grande caô, queima neurônio mesmo, te deixa lento e bobão... use e assuma suas conseqüências.

Na mesma Tarkus (novidade...), apontei um disco (“Supernaut”, do 1.000 Homo DJs) no catálogo da loja, com as devidas referências garantidas de que era bom (uma resenha em algum lugar que agora não me recordo), e na hora de fazer o pedido acabei indicando outro por engano. Veio a encomenda, tinha que arcar com seus custos e resolvi levar a bolachinha errada, da banda 16 Volt, assim mesmo, sendo que não tinha referência alguma sobre eles. Até que me surpreendi, pois o estilo do álbum "Wisdom" era o mesmo industrial que estava buscando na encomenda, e o som revelara ali uma saudável mistura de Front 242 com a sonoridade do álbum "The Land of Rape and Honey", do Ministry. O diferencial residia nas guitarras sujas (estilo grunge) e vocais nem sempre distorcidos, muitas vezes em empostação suave e limpa. Me empolguei e encomendei "Let Down Crush" e ali sim vi algo de altíssima qualidade: uma interessante mistura de NIN com Die Warzau (ver post abaixo), bons refrãos e produção de uma perfeição ímpar. Alguns amigos meus curtiram o som, mas foi com "Super Cool Nothing" mesmo que a maioria chapou, pois os caras injetaram guitarras envenenadas de afinação baixíssima, e entremeadas por vocalizes doces e singelas, quase que canções de ninar – imagine o King Kong, com toda a sua truculência, cantando com voz suave para sua amada, e você terá uma boa visualização do som do 16 Volt neste disco.

Enfim um som deste post que não preciso citar a Tarkus! Na verdade, se trata de um disco de vinil que comprei na Laser Discos (e lá só vendia CD...) há 16 anos. Fui na loja do Boulevard da Praia atrás de um bolachão do Ned’s Atomic Dustbin, ("God Fodder"), do qual havia tido ótimas referências. Achei o dito cujo, botei pra escutar e não curti tanto assim não. De qualquer forma, pedi para o vendedor embalar que eu levaria assim mesmo. Eis que o cara deve ter visto duas capas com símbolos atômicos lado a lado, pegou o disco errado, e eu levei para casa sem saber da cagada cometida. Há males que vão para o bem, pois o primeiro acesso de raiva deu lugar à curiosidade de ouvir o som daquela banda de nome tão irônico quanto esquisito: Pop Will Eat Itself – o título do disco também ia nesta onda, “This Is The Day, This Is The Hour, This Is… This!". Eu estava mais antenado do que nunca com acid house, dance music e novidades dançantes do tipo, e caí pra trás ao ouvir o som de uma banda que misturava tudo – eu disse tudo! - o que rolava de moderno e atual na época (1990). O PWEI, como é conhecido, é um bando de malucos britânicos entupidos de ecstasy e cultura pop, que pareciam curtir tanto uma fritação numa rave, quanto um headbanging num show de heavy metal. Mas eu não sabia nada disso em 1990, e fui me supreendendo com cada riff de guitarra (sampleados ou tocados à vera), samples/referências de todo o tipo (Alan Moore, Twilight Zone, AC/DC, Marargaret Tatcher...), scratches, batuques (rola até um sambão!) e refrãos tão grudentos quanto geniais. Algum tempo depois fui ler uma resenha altamente elogiosa (by André Forastieri) na Revista Bizz sobre o disco posterior, "Cure For Sanity", e procurei o bicho sem conseguir achá-lo em loja alguma daqui do ES. Pode-se dizer que, inicialmente, paguei gato por lebre na loja de discos. Mas, ao chegar em casa, fiquei feliz por ter comprado o ítem errado, pois o tal do Ned’s Atomic Dustbin não era nada daquilo que haviam cantado no meu ouvido e considero a banda frouxa até hoje!

*Este disco do PWEI eu simplesmente não consegui fazer ninguém gostar dele na época. Também, pudera: era dance music de um lado e roqueiros de outro, aquela divisão besta e mais radical do que nunca. Bandas de indie dance como Happy Mondays, Soup Dragons e The Charlatans – muito em voga naqueles anos – pareciam fazer parte da Congregação das Senhoras de Nazaré comparadas à loucura do PWEI. Por isso mesmo que permaneceram sempre no semi-anonimato e cultuados por poucos e bons famosos (Trent Reznor é um fã declarado).
**Em que se pese o único hit da história do PWEI, “Def Con One” (do álbum citado no post), ter tocado horrores nas rádios brasileiras em sua versão remix e tendo saído em coletânea de dance barata da Som Livre faça com que, de repente, alguém aí se lembre deles...

terça-feira, setembro 05, 2006

terça-feira, agosto 08, 2006

As Pequenas Indústrias, e Os Grandes Negócios


Imagem by In Strict Confidence Official Website

Em qualquer universo musical existem aquelas divisões de categorias de artistas. A maioria trafega no terceiro escalão, lugar-comum daqueles que mal chegam a uma única faixa realmente memorável por disco. No segundo escalão situam-se aqueles que chegam na média, agradam a todos, mas poucas vezes produzem obras inesquecíveis. No primeiro escalão residem os que descansam confortavelmente acima da média, sempre ditando regras e mantendo um alto padrão de qualidade. Por fim, existem aqueles que estão acima de qualquer suspeita, intocáveis que são, que de alguma forma iniciaram alguma coisa, foram precursores em mudar parâmetros – em outras palavras, colocaram seu nome na história por definitivo. No cenário do som Industrial também residem artistas enquadrados nestas categorias. Dos nomes citados a seguir, dois estão no primeiro escalão, enquanto que um do segundo pelotão almeja bravamente sua posição de destaque maior. Aos intocáveis, meu ansioso aguardo por novidades.

Dentre os Intocáveis do cenário Industrial - Cevin Key (Skinny Puppy), Al Jourgensen (Ministry), Franz Treichler (The Young Gods) e Trent Reznor (Nine Inch Nails) à frente - existem aqueles que também deixam suas marcas, ainda que numa escala menor. Jim Marcus, mentor do duo de Chicago (EUA) Die Warzau, é um destes pequenos fodões da área, sendo cultuado no seu habitat como um geniozinho das engrenagens digitais. Sua banda pratica um tipo bem específico de som industrial, algo que poderia ser definido como cool dancing industrial (inventei agora! hehehehe). As máquinas pesadas estão lá, sempre presentes. Mas sua química sonora destaca também um clima cool, pendendo ora para o noir, ora para verdadeiros petardos dançantes. Os vocais são quase sempre sussurrados ou em ritmo cadenciado, algo como se Mark Sandman (Morphine) ainda estivesse vivo e resolvesse cantar numa banda de industrial. De sua restrita discografia (iniciada em 1988), destacam-se “Big Electric Metal Bass Face” (1991), com suas memoráveis misturas de rock industrial e synthpop e, principalmente, “Engine” (1995), onde contra-baixos em slap, saxofones jazzísticos, e metais funky davam um groove inédito ao sempre robótico e frio som industrial. Seu álbum mais recente (que só fui ouvir há pouco), “Convenience” (2004), vai ainda mais fundo em sua própria experiência sonora. Em termos de produção, o disco em questão é fantástico, com seus timbres (sub) graves inusitados e batidas robóticas suavemente manipuladas. As melodias estão ainda mais doces, e em determinados momentos rola até um clima lounge (“Crusaders”, “Permission” e “Glare”). O rock industrial clássico surge apenas em “Bliss” e “Linoleum”, enquanto que as demais faixas do disco vão surpreendendo a cada instante, como que se em cada cantinho ali residisse uma surpresa. Para quem acha que este gênero musical siginifica apenas barulheira digital minimalista, deveria ouvir isso aqui de mente aberta. A viagem é garantida!

O grupo alemão KMFDM lança praticamente um disco por ano, desde o seu início, no já longínquo registro de 1984. E o som pouco muda a cada álbum: trata-se de uma bem-sucedida mistura de heavy metal com industrial, permeada por muito escracho, vocais femininos totalmente pop e até mesmo infantis, e com todas as suas capas religiosamente seguindo a estética HQ. São uns pândegos, que não hesitam em gravar covers absurdas como “Holyday” (Madonna), “These Boots” (Nancy Sinatra) e “Mysterious Ways” (U2) e enfiar solos típicos de guitar heroes no meio de batidões techno e vocais distorcidos até o talo. Se a fórmula musical sofre poucas mudanças, o resultado é sempre acima da média, com a garantia de refrões poderosos, riffs de guitarra animais, muita diversão e dança desenfreada. “Hau Ruck”, lançado no final do ano passado (2005), é um pouquinho melhor que os outros, alinhando-se com alguns de seus melhores álbuns (“Nilhil”, “Angst” e “Näive: Hell to Go”). Há ecos de rock de arena (“Hau Ruck”, “Mini Mini” e “Auf Wiederseni’n”), refrões de vozes femininas que lembram uma Shirley Manson (Garbage) cibernética (“Professional Killer” e “You Are No Good”), e até mesmo um dub cara-de-pau no meio da zoeira digital (“Real Thing”). Ouça e constate de onde Marylin Manson chupa (sei...) algumas de suas melhores idéias.

Ainda dando seguimento ao raciocínio do início deste texto, venho frisar alguns pontos dos quais certos artistas se destacam da maioria. É o caso do Front 242, criador da EBM (electronic body music), que em suas faixas mais minimalistas ainda conseguia humilhar seus seguidores, fosse por um sample colocado no lugar certo, fosse por uma virada de bateria num local inusitado. Manipular climas para dar aquele fundão sombrio é lugar-comum para a trupe de neo-góticos que assombram os anos 00, mas uma nota de sintetizador teclada por Cevin Key em escassos segundos de qualquer faixa do Skinny Puppy consegue ser mais soturna e alienígena que qualquer horror sonoro planejado por muito garotão de corpse paint na cara. E quando Al Jourgensen resolve enfiar influências de country music em algumas das faixas mais animais de seu Ministry, toda uma geração de metaleiros industriais atual enche-se de interrogações em suas mentes. Mesmo os ícones do novíssimo gênero musical chamado future pop (que mistura batidas trance/techno à EBM e ao som gótico) já demonstram doses fartas de sabedoria, tal qual fez o Covenant em seu álbum mais recente (“Skyshaper” – resenhado aqui anteriormente). A experiência conta, e quem busca nas fontes certas tem grandes chances de subir mais e mais degraus. É o caso do duo também provindo da Terra do Chucrute (Alemanha) In Strict Confidence, que confirma sua ascensão gradual em seu mais recente álbum, “Exile Paradise” (2006). Do começo com claras influências da EBM clássica e tímidas apostas em territórios desconhecidos de seu primeiro álbum (“Cryogenix”, 1997 – que eu achei, olhe só, perdido no sebo do Martini, no Centro de Vitória, há alguns anos atrás!) até este lançamento atual, a banda vem galgando seu lugar entre os grandes. Ainda cai em alguns clichês, como o de inserir vocais fenininos nos refrões (isto está manjado pacas atualmente), mesmo que sejam bem produzidos. Mas seu som é bem mais consistente do que a maioria das bandas de EBM/industrial atuais, justamente por alternar os batidões retos do future pop com edições mais quebradas, sempre apresentando ótimas manipulações eletrônicas. Uma influência notável no instrumental e em alguns vocais que surge no som do In Strict Confidence é a do duo canadense Front Line Assembly, principalmente pelas bass lines graves e os climas mais cheios e melódicos que permeiam os canais de som. Bebendo em fontes saudáveis e duradouras, o In Strict Confidence vai deixando sua marca cada vez mais visível em seu meio de atuação.

quarta-feira, julho 26, 2006

Bom enquanto durou


Pista vazia só é bom no começo...
Fotos by: Kalunga


Era por volta de 1:30h da manhã (ou, pelo menos, eu deduzia), e o bicho estava pegando lá dentro. O negócio estava tão nervoso que eu resolvi dar uma voltinha lá fora, tipo para respirar um ar que não cheirasse a nicotina (e outras fumaças suspeitas) e vodka com coca-cola – já devia estar na décima dose daquela mistura. Sabe como é, “o olho do dono engorda o gado”, e fui dar uma conferida bilheteria (meio teatral era este ato, pois não tinha condições de somar algo mais complexo que dois+dois naquelas horas), ver o movimento e tal. Eis que eu vejo um monte de viaturas da Polícia Civil, com policiais de touca ninja e de metrancas exibidas nas janelas, passando em frente a mil. Como existia uma unidade policial ali ao lado, pensei que estivessem indo para lá. Ledo engano. Eles deram meia-volta, pararam à minha frente, mostraram um mandado de sei-lá-o-quê e entraram no recinto. Fodeu! Naquela baderna sem lei que estava lá dentro, com até o dono da bagaça aprontando ilegalidades das suas, iria todo mundo preso. Mas que nada! Foram do início ao final da casa, olharam alvarás e documentos em geral, cumprimentaram-nos educadamente e foram embora sem nada. Olha, ali eu reforcei minha crença de que certas situações são inabaláveis, de que uma conjunção de fatores positivos resiste a tudo. Depois foi só aumentar o som e gritar: “vamos quebrar tudo, porra!!!”.

Este episódio não vem a ilustrar algo como “o melhor bar de todos os tempos”, ou “essa época era foda”. Não é bem isso – se bem que é um pouco disso também. Aliás, se refere àqueles que, com eu, gostam dar a cara a tapa para tentar fazer e/ou usufruir de algo diferente de nosso restritíssimo usual. O extinto Pub 455 foi, pelo menos para a minha geração, o espaço mais perfeito para quem quisesse produzir algo movido a boa música, dançar boa música, embalar uma quebradeira com boa música e num local privilegiado como é nossa cidade de Vitória. Ter um pico para tomar umas e curtir um som com vista para o mar é para poucos lugares neste mundo. Reside – admito - uma boa dose de nostalgia nestas palavras pelo simples fato de um lugar assim fazer muita falta. Nem de longe era perfeito, pois tinha vários problemas estruturais como caixas lentos, filas e mais filas, banheiros que ía se deteriorando no decorrer da balada, enfim, quem quisesse falar fal, tinha munição também. Mas, na boa, aponte um local que reuniu tantos projetos envolvendo estilos musicais tão díspares quanto alternativos como este lugar aqui no Estado e eu te chamo de mentiroso. Tinha noite de house, breakbeat/drum’n’bass, techno, trance, dub, world beat, hip-hop, mpb, rock, blues, jazz, gótico, tudo o que você não vê/ouve que não seja pela tv ou pela internet. E ganhei uma boa grana nas festas que fiz por lá, reforçando a sua viabilidade como o local certo na hora certa.

Localizado em um ponto nobre do bairro Barro Vermelho, região de Praia do Canto, Vitória, o Pub 455 pagou o preço por estar justamente entre os nobres - choviam reclamações dos vizinhos sobre barulho, bagunça, drogas, enfim, tudo aquilo que seus filhos aprontam, mas que não era bem o local que eles freqüentavam. Pobres alternativos, que não fazem mal a uma mosca e carregam a má fama por não freqüentarem boates da moda. Moda? Se bem que muita gente que ía para alguma destas boates bombadas (inclusive os filhos da vizinhança nobre!) acabava ficando por lá, atraídos pela enorme fila do lado de fora, e foda-se o som que estivesse rolando. Fenômeno estranho este que rola por aqui, de misturar patrícias, maurícios, indies, clubbers, góticos e pitboys num só lugar, todos muito diferentes entre si, mas incapazes de resistir a um recinto lotado até o cú rasgar. Este mesmo fenômeno é o que fazia o Pub 455 bombar e cair vertiginosamente numa constância absurda. A mistura é saudável até certo ponto, pois é muito bacana atrair para sua festa gente de todo o tipo – mais cabeças diferentes para plantar informação, saca?. Mas as motivações duram até o dia em que seu evento não encher tanto assim, de perder o interesse até mesmo de seu próprio público (tipo indie de festa de rock alternativo, tranceiro de festa trance, e por aí vai) por conta de alguma micareta que, mesmo que você não fosse, não se arriscaria ir ao Pub com aquela clássica e patenteada pergunta capixaba-provinciana: “Será que vai dar gente?”. Foi assim que propostas inovadoras caíram no esquecimento, fazendo com que o Pub 455 amargasse quase um ano de ostracismo, de descrença geral, até surgir um súbito renascimento nos seus últimos seis meses de vida. Atolados de dívidas diversas (contas, encargos trabalhistas, multas), os donos do local fecharam tudo e picaram a mula daqui. Terminou, pelo menos, no seu auge.

Agora não adianta chorar pitangas! Cansei de ver gente que detonava o lugar e agora está se lamentando por seu fim. Capixaba é feliz e não sabe. Recebe o doce na sua boca, come tudo e ainda tenta arrancar sua mão. Passei outro dia lá em frente e o local está totalmente destruído. Manja aquele final do filme “Poltergeist”, quando a casa da família que é assombrada pelos espíritos acaba simplesmente sugada para debaixo da terra? Pois é, parece ter recebido o mesmo fim, levando consigo toda a carga provinciana recebida em pouco mais de um ano de vida para sete palmos abaixo. Esqueçam de fazer qualquer coisa por lá, pois sua época já foi, e só com muita grana na mão para poder reeguer aquela estrutura. Mas algumas lições sempre permanecem.

O Pub 455 registrou uma troca de guarda de gerações, e foi um local onde se reunia gente entre beirando e após os trinta, e também recém chegados à idade adulta. Tinha que ter um tanto de disposição para encarar o desconhecido, de apostar em novas propostas, um ímpeto que se dilui quando se dão muitos tiros n’água – e foram muitos, ainda que inadivetidamente, naquele lugar. A tal troca de guarda se deu entre a primeira fase do Pub, de seu início em 2002 e metade de 2003 - quando um povo viciado no esquema “pô, tem que pagar para entrar” (lembra daquela galera que lotava o lado de fora do Sala 11 e não entrava? Era esta gente...) afundou o local pela primeira vez – e o segundo semestre de seu último ano, quando uma nova geração, munida de downloads e fotologs (anda não havia Orkut) combinava de se encontrar no local onde rolava seus sons preferidos. Este mesmo público lota todas as festas da Antimofo, que o satisfaz no ritmo conta-gotas, com eventos esporádicos para não cansar a galera. Pois é, o povo daqui cansa quando tem o que gosta. O Pub 455 cansou nossa beleza! Que venham outros iguais! Eu vou estar lá, me cansando para cansar a beleza dos outros, pode crer!

+ Fotos:

Esta foto minha junto com o Fuka resume a cachaçada que rolava naquela cabine de DJ. Matamos uma garrafa de wisky ali mesmo e mais um monte de doses de vodka


Vista da área externa


Ah, a fluorescência...


Botar som pra pista lotada assim é bom...


Taylor, um dia, já foi O DJ de Rock daqui. Sai da toca, meu filho!

segunda-feira, julho 17, 2006

Velharias supreendentes

Nunca a informação esteve tão fácil ao seu alcance. E parece que isso não necessariamente significa bom uso dela. Seria óbvio demais cair na tentação de sair detonando as novas gerações, de que elas têm tudo nas mãos e fazem mau uso disso e bla blá blá. Só sei de uma coisa: estamos presenciando uma mudança na forma de adqüirir informação de uma maneira nunca antes vista, e só comparável à rádio e à TV quando estes se transformaram em bens acessíveis às massas. Algum velhaco aí poderia dizer que vivia muito bem sem internet nem DVD, por exemplo, antes destes aparecerem ao mundo. Pois bem, eu vivi muito bem sem eles, mas vivo muito melhor com eles. E definitivamente não consigo imaginar alguém aí com saudade daquela porcaria de tecnologia de VHS, por exemplo... E se algum gadget digital desses aí me incomodar, é só desligá-lo e pronto. É por isso que não tenho orkut, e também não sinto o menor remorso em desligar meu telefone celular quando me convém. Mas não sou tão novo assim, e aprendi a crescer sem esta híper informação, e saber valorizar o que tenho em mãos. Porém, é difícil cobrar de alguém com seus vinte e (bem) pouco anos um discernimento maior sobre o que ele baixa na internet, e também sobre o que ele deve buscar e se aprofundar. Quer saber? Ninguém tem que te dizer porra nenhuma! Ficou curioso? Vá pesquisar no Google, se vira!

Digo isso tudo aí em cima porquê alguns sons dos quais vou falar a seguir eu simplesmente tinha uma vontade absurda de conhecê-los mais a fundo. Mas isso foi entre dez e quinze anos atrás, quando o que tinha de fazer, de fato, era correr atrás da informação com o que tinha em mãos – ou seja, quase nada! Uma faixa numa coletânea em vinil e outra em K-7 eram tudo o que tinha sobre os dois nome a seguir. Daí que eu olhava no enorme catálogo da Tarkus, onde encomendava discos importados, e ficava numa dúvida torturante de arriscar meu suado dinheirinho num disco que poderia ser ruim ou não. Durante este período, rolou um óbvio processo de seleção, pois alguns sons eu já havia lido algo em alguma revista ou fanzine, e mereciam uma arriscada. Quanto a certos outros sons, se eu não sabia mais nada além de uma mera música (“seria esta a única boa?”, “e se a banda for uma merda?”), ficava pra escanteio. Só que isto aqui não é uma porcaria de um texto nostálgico! Se hoje me aparece uma conexão rápida de internet em mãos, vou mais é aproveitar. Vi muito vídeo em fita de VHS, comprei muito fanzine, tirei muita foto em película, gastei muito interurbano e reais de acordo com cotações do dólar para encomendar CDs fora do Estado e do Brasil. Hoje eu adoro a internet e os computadores cada vez mais velozes, e não sei viver sem minha câmera digital (que, com cinco anos de idade, já está velhusca!) e um disco de DVD que não corre o risco de mofar igual àquelas procarias em VHS! Enfim, sobre os dois sons a seguir, precisei apenas de alguns cliques para, finalmente, poder saber mais sobre eles. E, o melhor de tudo: no meio da busca na incrível teia digital de informações que é a web, acabei me surpreendendo!


Ainda criança e até pré-adolescente, fui desviado dos Caminhos do Mal do Heavy Metal (cujo primeiro disco de minha vida foi o “Creatures of The Night”, do Kiss, em 1983) por um álbum do Kraftwerk (“Electric Cafe”), e assim acabei adentrando no mundo maravilhoso do techno-pop dos anos 80 – e já contei esta história ano passado por aqui. Fora os escassos discos de vinil que tinha acesso, minha fonte de informação nesta área se ampliou com uma fitinha K-7 que continha, entre outras maravilhas, duas músicas fantásticas do Ultravox. Veio a internet e fui saber que o seu ex-vocalista, John Foxx, tinha uma respeitável carreira solo, e que havia lançado em 2003 um excelente álbum, totalmente inserido no electro atual. “Crash & Burn”, realizado com seu parceiro de longa data Louis Gordon, vai além desta definição simplória, pois se configura num excepcional representante da música eletrônica como um todo, agregando valores como o já citado electro, além de synthpop, EBM/industrial, melodias marcantes, minimalismo eletrônico, vocais estilosos, letras inteligentes e a vasta experiência de um cara que sabe bem cada passo que dá. Faixas como “Drive”, “Broken Furniture” e “Ray 1/2” são exemplos perfeitos de synthpop clássico e atual ao mesmo tempo, enquanto que “Sidewalking”, “Sex Video” e a faixa-título beiram a EBM/industrial e com ecos de trance. Supreendentemente, “Cinema” e “Once a While” soam como um um remix minimal techno em ritmo jazzy, ao passo de que a onipresente influência de Kraftwerk ressoa em “Ultraviolet/Infrared” e “She Robot” de forma incisiva. Tudo é muito dançante, com inúmeros detalhes ecoando das caixas de som, sempre com as melodias e arranjos em constante evolução ao longo dos minutos que correm no CD-Player – ou MP3 player, se preferir.

De uma única faixa que constava numa coletânea em vinil de EBM/industrial lançada em 1989 pela extinta gravadora Stiletto (acho que se chamava “Generate” e que me foi roubada), não tive mais nenhuma referência sobre The Legendary Pink Dots, ao contrário de Cassandra Complex, The Neon Judgement e The Young Gods, também presentes na tal compilação e que tive a sorte de saber mais sobre eles logo depois, para justamente correr atrás de vossos materiais. No meio de tantos downloads realizados nos últimos cinco anos, lembrei-me deste grupo e corri atrás. Trata-se de uma dupla de Londres, composta por K-Spel e Phil Knight que, tão logo se mudaram para Amsterdã, parecem ter se aproveitado bonito da política liberal quanto ao uso de drogas naquela cidade. O fato é que “Cursed Velvet Apocalypse”, lançado em 1990 (ainda à epoca da tal coletânea), transparece um tipo de psicodelia cujo conteúdo eu nem sabia que existia. Tentando achar uma definição: parece um cruzamento de Jethro Tull com as faixas mais doentes do Skinny Puppy. Mas não é só isso! Os vocais de K-Spell (que nominho, hein?) parecem ter saído de algum esquete do Monty Phyton, e instrumentos acústicos como violas, cellos, harpas e percussões se fundem com manipulações eletrônicas vindas direto dos circuitos digitais da EBM e do som industrial. É um troço esquisito, mas está longe de ser inaudível. Sobressaem-se melodias medievais (é sério!) que até dão para cantar junto, aliadas a ambiências sonoras que pululam de um canal a outro no fone de ouvido. A faixa chamada “The Death of Jack The Ripper”, por exemplo, soa como se fosse o fundo musical do que seria um filme de Rei Arthur rodado no cenário de Matrix! Já “C.V.A.” não faria feio num filme de Tim Burton, tipo “A Noiva Cadáver”. Dentre as demais misturas malucas, temos música indiana mixada com trilha para funerais (“Green Gang”), folk tribal (?) com base EBM (“Hellsville”), Dead Can Dance e Renaissence se encontrando com o Robocop (“New Tomorrow”) e uma balada gótica legítima (“Princess Coldheart”). Como o papo de “rock progressivo/psicodélico” pintou em alguns comentários de posts anteriores, posso dizer que estou adentrando neste estranho universo de trás para frente. Uma hora eu chego no Vale das Maçãs...

sexta-feira, junho 30, 2006

Novidades, velharias, náuseas...

Enfim alguma banda nova atraiu minha atenção! Bom, na verdade, eu caí a armadilha de ser seduzido pelo velho embalado no novo. O duo californiano She Wants Revenge adora Joy Division. Mas o Interpol também adora a banda do finado Ian Curtis, e nos dias atuais de informação à velocidade da conexão de internet que o seu bolso pode bancar, o quarteto de NY já é veterano, pois conquistou a incrível marca de dois álbuns lançados! Pois bem, a proposta do She Wants Revenge é mais divertida, vertendo o som do Joy Division paras as batidas digitais das pistas de dança, sem se esquecer de baixo-guitarra bem marcadinhos e uns cacoetes oitentistas (Human League e Depeche Mode, basicamente) aqui e acolá. Tudo bem, mais um coelho surge desta cartola exigindo seus direitos, pois o próprio New Order seguiu sua carreira após o fim do JD justamente apostando na eletrônica. Olha, está difícil falar de alguém que tenha uma idéia original nestes dias atuais... Bom, o que importa é que esta bandinha de nome bacaninha aí é bem divertida e fará a cabeça tanto de góticos cheirando a naftalina quanto de neófitos fãs da nova-salvação-do-rock-que-baixei-hoje-à-tarde. E a tal da “I Don’t Want to Fall In Love” é o meu hit atual que fará minha glória no comando de uma pista de dança, ha-ha!

Rudy Ratzinger não é parente do Papa Bento XVI, e se tivesse vivido na época da Inquisição, iria pra fogueira sem dó. A verdade é que a mente deste alemão vive povoada dos mais sinistros sentimentos humanos, revestidos na forma de uma espécie de EBM (electronic body music) com peso e intensidade jamais vistos. Ao contrário de muitos de seus pares nesta vertente do som industrial, o dono do Wumpscut não apela para guitarras distorcidas nem para os ritmos ultra rápidos e apelativos do gabba. Em “Cannibal Athem”, seu mais recente lançamento (2006), os sintetizadores e as drum machines continuam com o peso de uma bigorna, mantendo a tradição dos vocais distorcidos e (a partir de “Wreath of Barbs”, 2001) belas intervenções femininas. As letras são delicados tratados sobre toda a sorte de assassinatos, mutilações e exorcismos. Ouvir Wumpscut é uma experiência marcante – para o bem ou para o mal, dependendo de sua visão de vida.
*Esta espécie de “EBM do Mal” tem como percussor o duo belga Vomito Negro, e como seguidores – além do próprio Wumpscut – grupos como Allied Vision e Velvet Acid Christ.

A palavra “Tributo” no meio musical adqüire sinônimos como “Assassinato”, “Insulto”, “Indulgência” e “Heresia”, tal qual a enorme quantidade das terríveis coleções em homenagem que assolam nossos ouvidos constantemente. É um verdadeiro desfile de gente sem talento em busca de um lugar ao sol às custas de parasitismo falcatrua que nem vale mais à pena ouvir estes monstrengos, nem mesmo por curiosidade. E o pior de tudo é que a vertente industrial é pródiga neste tipo de lançamento. O primeiro que ouvi foi o do Metallica, cujas melhores versões (a saber: Hellsau, Apoptygma Berzerk, Die Krupps e In Strict Confidence) são aquelas que não têm absolutamente nada a ver com o original, nem mesmo riffs ou melodias – totalmente desnecessárias, então. Depois me aparece um tributo ao Tool, que até conta com bandas promissoras (Haujobb, Electric Hellfire Club e Razed in Black), mas que mesmo estas conseguem provocar náuseas, fazendo valer à pena somente pela correta versão de “Stinkfist” cometida por Maya Hiena, com vocal feminino e pouca (nenhuma?) mudança em relação ao original. Pior mesmo é o tributo ao Skinny Puppy, que conta com praticamente a mesma escalação de perdedores e promissores que queimam o filme igualmente, sendo que não há para onde correr, pois bandas de industrial fazendo cover de outra banda de industrial soa sem sentido. Tem também uns dois discos em homenagem ao Ministry, sendo que muitas das faixas escolhidas são justamente da fase technopop da qual Al Jourgensen (o suposto homenageado) renega até a morte. Pelo menos tem uma versão folk e com vocal feminino de “Scarecrow” que é bem engraçada. No final das contas, “disco-tributo” define uma máxima: a de que todas as bandas participantes não chegam aos pés do homenageado. E se o homenageado tiver sua importância questionada ao ponto de realmente merecer um tributo, é porque os envolvidos em tal empreitada não possuem futuro algum na música!
*Tributo por tributo, eu só ouvi um até hoje que me passou algo positivo: o primeiro volume dedicado ao Black Sabbath. Homenagem com reverência, respeito e (na maioria dos casos) inovação.

sexta-feira, junho 16, 2006

Sons!

Olha, é difícil achar alguém que diga: Eu odeio Ramones!. A não ser que o indivíduo ligue a música do quarteto de Nova York com algum acontecimento ruim em sua vida, ainda não topei com tal sujeito na minha frente até hoje! Mesmo mergulhado em techno-pop e afins em meados dos anos 80, eu tinha minha fitinha K-7 (dupla!) com o “Ramonesmania” e ouvia direto. Naquela época o pau comia entre punks e metaleiros, mas os Ramones tinham o dom de fazer todo mundo gostar deles – inclusive quem não era muito afeito ao rock and roll em si. Pois é, o tempo foi passando, o quarteto da jaqueta de couro e do jeans rasgado foi ficando guardado no coração de seus fãs e na memória afetiva dos não-tão-fãs-assim, e sua música já não era nem de longe a referência para os hypes de então quando da morte de seu vocalista. A revista Bizz, por exemplo, dedicou apenas uma página em “homenagem” ao falecido, ainda assim pondo em questão a sua real importância para a história da música popular mundial. Em plenos anos 2000, na Era do Download, Nova York voltou a ser a bola da vez e os Ramones, como que num passe de mágica, voltaram a povoar a mídia, com homenagens e quetais. A verdade é que ficou inevitável demais não homenageá-los, tendo em vista o triste fato de que três dos quatro membros originais estarem se encontrando six feet under. Podem dizer que eles se repetiam, que exaltavam a rebeldia jovem tendo idade para serem pais – avós, até! – do seu público-alvo, ou que só povoavam os corações de fãs do Terceiro Mundo. Beleza! Mas, ao ouvir um discão como “Too Tought To Die” em pleno ano de 1984, no auge do exagero plastificado dos anos oitenta, é uma tarefa gratificante. Numa era de teclados baratos, baterias eletrônicas quadradas e cabelos de mullets, os quatro Ramones mantiveram seu visual (aliás, carregando ainda mais no preto e no couro) e gravaram um disco pesadão, cru e na cara. Além de seu velho e irresistível som punk/bubblegum, haviam ecos de psychobilly e hardcore dos bons (com Dee Dee nos vocais). Doces melodias embaladas por guitarras bem pesadas para o padrão da época. Não seguiam moda, seus planos de conquistar o mundo fracassaram (quem viu o documentário “End of Century” sabe da história), e só restava fazer o que gostavam, remando contra todas as marés possíveis. Um disco que não faria feio numa pista de festinha rock, e que daria um tapa na cara dessa galerinha nova aí que parece só conhecer “I Wanna Be Sedated”.
*É fácil eu cair no lugar-comum e sair por aí descendo o pau nas gerações mais novas que a minha. Porra, tô sentindo na pele esta tentação me cutucando! Quarta passada (14/06) botei pra rolar sons tipo Suede e Blur numa festa e ninguém conhecia. De 2000 pra trás, tudo deve ser muto velho, os Strokes já são veteraníssimos, e eu estou virando um dinossauro???
**Paulinho, eu ouço esta porra de disco maravilhoso o dia inteiro! Só faltam agora o “Animal Boy” e o “Halfway to Sanity” pra você me dar de presente e completar a trilogia metal dos Ramones, hehehehehehe...


Amantes dos sons das catacumbas têm o Cassandra Complex entre seus mimos preferidos. Eu tinha um exemplar em vinil do álbum “Cyberpunx” (1990), adqüirido junto da leva de bandas de industrial/ebm que fizeram a cabeça de toda uma geração tupiniquim. O bolachão me foi roubado junto de mais ums 50, e acabei por deixar a banda esquecida no espaço-tempo. Quanta injustiça! Resolvi clicar no Soulseek o seu nome e agora estou completando sua discografia. Uma definição bem objetiva do som destes ingleses: gorhic rock a lá Sisters of Mercy carregado com muita eletrônica e guitarras invariavelmente distorcidas. Amantes do maravilhoso som dos anos 80 (o que realmente de bom foi produzido) vão gostar do sabor synthpop + gothic rock de “Grenade” (1986) e “Feel The Width” (1988). Àqueles que gostam de EBM e industrial vão pirar no já citado “Cyberpunx” e, principalmente, em “Sex & Death” (1998 – que tem toques estilo NIN e de eletrônica bem pesada). E os fãs de última hora da banda de Andrew Eldtricth – patrono dos Sisters of Mercy e maior referência de som gótico de todos os tempos – vão gostar de “Wetware” (2000). A banda continua na ativa, seus álbuns só se encontram em versões européias (com exceção de “Wetware”), e não é tão fácil assim de baixar na internet. Resumindo: é som para iniciados – se as referências citadas aqui não lhe agradam, nem tente!

Escrever sobre o Tool é tarefas das mais complicadas. Trata-se de uma das bandas mais íntegras em sua proposta musical que apareceram nos últimos 15 anos. O que mais me impressiona em sua música é que seus (poucos) álbuns possuem uma clara ligação entre si, cada qual representando um passo maior em direção de seu próprio universo. Seus videos são simplesmente os mais fantásticos que se têm notícia, ao conseguir fazer com que imagens que não economizam em tecnologia sejam a visualização perfeita de sua experiência sonora única. É fato que não se trata de uma banda de fácil digestão, com faixas longas, mudanças de andamento constantes, álbuns que não possuem letras das músicas, e quatro caras que tocam pra caralho – e isso incomoda muita gente. Há uma ligação sim com o terrível rock progressivo, mais por conta da estrutura de sua música do que com a sonoridade final em si. O Tool é fruto da geração grunge, seus riffs e melodias vocais evocam àquela era, e não aos dinossauros progressivos dos anos 70 – e isso faz torcer o nariz também dos coroas fãs daquele período musical específico. Com tantos contras, porque que os caras possuem um séquito fiel e muito numeroso? Em 15 anos de banda, possuem apenas quatro álbuns oficiais (fora Eps e tal) e a vinda de um novo lançamento é aguardada com uma comoção inexplicável para uma banda tão, digamos, inacessível. Seu disco mais recente, “10.000 Days” (2006), apenas reforça o culto, pois a alma de sua música continua intacta. Se cabe uma crítica, posso afirmar que o Tool muda muito pouco a cada disco, ainda que este lançamento tenha uma pegada mais stoner e que seu som esteja ainda mais intrincado instrumentalmente. Quanto ao vocalista Maynard Keenan, posso afirmar que este já ocupa o posto de uma das principais vozes nos anais do rock and roll, pois seu estilo único e sua capacidade de criar melodias marcantes e originais encontram poucos paralelos hoje em dia. Entrar no universo do Tool não é fácil – ainda que este que vos escreve tenha pirado logo de cara. Se na primeira faixa – de qualquer álbum – você não sintonizar na dos caras, vou logo avisando: o que virá pela frente será bem pior!
*Supondo que os discos do projeto paralelo A Perfect Circle poderiam amenizar a agonia pela demora nos lançamentos da banda principal, eu assumo a postura daquele fã chato e pentelho. Vou logo escrevendo: A Perfect Circle é um Tool de muletas! Ótimos discos, mas a aura da banda titular está ali, esfregando na cara e avisando sobre quem realmente manda!