terça-feira, agosto 08, 2006

As Pequenas Indústrias, e Os Grandes Negócios


Imagem by In Strict Confidence Official Website

Em qualquer universo musical existem aquelas divisões de categorias de artistas. A maioria trafega no terceiro escalão, lugar-comum daqueles que mal chegam a uma única faixa realmente memorável por disco. No segundo escalão situam-se aqueles que chegam na média, agradam a todos, mas poucas vezes produzem obras inesquecíveis. No primeiro escalão residem os que descansam confortavelmente acima da média, sempre ditando regras e mantendo um alto padrão de qualidade. Por fim, existem aqueles que estão acima de qualquer suspeita, intocáveis que são, que de alguma forma iniciaram alguma coisa, foram precursores em mudar parâmetros – em outras palavras, colocaram seu nome na história por definitivo. No cenário do som Industrial também residem artistas enquadrados nestas categorias. Dos nomes citados a seguir, dois estão no primeiro escalão, enquanto que um do segundo pelotão almeja bravamente sua posição de destaque maior. Aos intocáveis, meu ansioso aguardo por novidades.

Dentre os Intocáveis do cenário Industrial - Cevin Key (Skinny Puppy), Al Jourgensen (Ministry), Franz Treichler (The Young Gods) e Trent Reznor (Nine Inch Nails) à frente - existem aqueles que também deixam suas marcas, ainda que numa escala menor. Jim Marcus, mentor do duo de Chicago (EUA) Die Warzau, é um destes pequenos fodões da área, sendo cultuado no seu habitat como um geniozinho das engrenagens digitais. Sua banda pratica um tipo bem específico de som industrial, algo que poderia ser definido como cool dancing industrial (inventei agora! hehehehe). As máquinas pesadas estão lá, sempre presentes. Mas sua química sonora destaca também um clima cool, pendendo ora para o noir, ora para verdadeiros petardos dançantes. Os vocais são quase sempre sussurrados ou em ritmo cadenciado, algo como se Mark Sandman (Morphine) ainda estivesse vivo e resolvesse cantar numa banda de industrial. De sua restrita discografia (iniciada em 1988), destacam-se “Big Electric Metal Bass Face” (1991), com suas memoráveis misturas de rock industrial e synthpop e, principalmente, “Engine” (1995), onde contra-baixos em slap, saxofones jazzísticos, e metais funky davam um groove inédito ao sempre robótico e frio som industrial. Seu álbum mais recente (que só fui ouvir há pouco), “Convenience” (2004), vai ainda mais fundo em sua própria experiência sonora. Em termos de produção, o disco em questão é fantástico, com seus timbres (sub) graves inusitados e batidas robóticas suavemente manipuladas. As melodias estão ainda mais doces, e em determinados momentos rola até um clima lounge (“Crusaders”, “Permission” e “Glare”). O rock industrial clássico surge apenas em “Bliss” e “Linoleum”, enquanto que as demais faixas do disco vão surpreendendo a cada instante, como que se em cada cantinho ali residisse uma surpresa. Para quem acha que este gênero musical siginifica apenas barulheira digital minimalista, deveria ouvir isso aqui de mente aberta. A viagem é garantida!

O grupo alemão KMFDM lança praticamente um disco por ano, desde o seu início, no já longínquo registro de 1984. E o som pouco muda a cada álbum: trata-se de uma bem-sucedida mistura de heavy metal com industrial, permeada por muito escracho, vocais femininos totalmente pop e até mesmo infantis, e com todas as suas capas religiosamente seguindo a estética HQ. São uns pândegos, que não hesitam em gravar covers absurdas como “Holyday” (Madonna), “These Boots” (Nancy Sinatra) e “Mysterious Ways” (U2) e enfiar solos típicos de guitar heroes no meio de batidões techno e vocais distorcidos até o talo. Se a fórmula musical sofre poucas mudanças, o resultado é sempre acima da média, com a garantia de refrões poderosos, riffs de guitarra animais, muita diversão e dança desenfreada. “Hau Ruck”, lançado no final do ano passado (2005), é um pouquinho melhor que os outros, alinhando-se com alguns de seus melhores álbuns (“Nilhil”, “Angst” e “Näive: Hell to Go”). Há ecos de rock de arena (“Hau Ruck”, “Mini Mini” e “Auf Wiederseni’n”), refrões de vozes femininas que lembram uma Shirley Manson (Garbage) cibernética (“Professional Killer” e “You Are No Good”), e até mesmo um dub cara-de-pau no meio da zoeira digital (“Real Thing”). Ouça e constate de onde Marylin Manson chupa (sei...) algumas de suas melhores idéias.

Ainda dando seguimento ao raciocínio do início deste texto, venho frisar alguns pontos dos quais certos artistas se destacam da maioria. É o caso do Front 242, criador da EBM (electronic body music), que em suas faixas mais minimalistas ainda conseguia humilhar seus seguidores, fosse por um sample colocado no lugar certo, fosse por uma virada de bateria num local inusitado. Manipular climas para dar aquele fundão sombrio é lugar-comum para a trupe de neo-góticos que assombram os anos 00, mas uma nota de sintetizador teclada por Cevin Key em escassos segundos de qualquer faixa do Skinny Puppy consegue ser mais soturna e alienígena que qualquer horror sonoro planejado por muito garotão de corpse paint na cara. E quando Al Jourgensen resolve enfiar influências de country music em algumas das faixas mais animais de seu Ministry, toda uma geração de metaleiros industriais atual enche-se de interrogações em suas mentes. Mesmo os ícones do novíssimo gênero musical chamado future pop (que mistura batidas trance/techno à EBM e ao som gótico) já demonstram doses fartas de sabedoria, tal qual fez o Covenant em seu álbum mais recente (“Skyshaper” – resenhado aqui anteriormente). A experiência conta, e quem busca nas fontes certas tem grandes chances de subir mais e mais degraus. É o caso do duo também provindo da Terra do Chucrute (Alemanha) In Strict Confidence, que confirma sua ascensão gradual em seu mais recente álbum, “Exile Paradise” (2006). Do começo com claras influências da EBM clássica e tímidas apostas em territórios desconhecidos de seu primeiro álbum (“Cryogenix”, 1997 – que eu achei, olhe só, perdido no sebo do Martini, no Centro de Vitória, há alguns anos atrás!) até este lançamento atual, a banda vem galgando seu lugar entre os grandes. Ainda cai em alguns clichês, como o de inserir vocais fenininos nos refrões (isto está manjado pacas atualmente), mesmo que sejam bem produzidos. Mas seu som é bem mais consistente do que a maioria das bandas de EBM/industrial atuais, justamente por alternar os batidões retos do future pop com edições mais quebradas, sempre apresentando ótimas manipulações eletrônicas. Uma influência notável no instrumental e em alguns vocais que surge no som do In Strict Confidence é a do duo canadense Front Line Assembly, principalmente pelas bass lines graves e os climas mais cheios e melódicos que permeiam os canais de som. Bebendo em fontes saudáveis e duradouras, o In Strict Confidence vai deixando sua marca cada vez mais visível em seu meio de atuação.