terça-feira, setembro 23, 2008

ALGUNS SONS...

E não estranhe se este blogg for atualizado por dez dias seguidos ou só no ano que vem.

Covenant – “In Transit”


A sofisticação do figurino dos caras combina com sua música

Uma das melhores bandas eletrônicas da atualidade, o trio sueco Covenant - não confundir com o black metal industrial The Kovenant – lançou outro disco ao vivo em 2007 (o primeiro, “Synergy – Live In Europe ”, é de 2000). “In Transit ” contém mais uma leva de belíssimas canções sobre bases digitais modernas e dançantes. O rótulo futurepop, do qual o trio é comumente associado à sua concepção, não comporta mais a excepcional música destes caras – eles estão mais para um Depeche Mode dos novos tempos. Ouça, por exemplo, a magistral versão ao vivo de “Bullet” ou a melodia singela de “Happy Man” cantada perfeitamente pelo vocalista Eskil Simmonsson, e constate que a famigerada mistura de synthpop com EBM e melodias trance – a grosso modo, o que consiste o futurepop – não é mais suficiente para resumir o que é o Covenant. Este disco ao vivo é uma boa coletânea de algumas de suas melhores faixas, mas o barato mesmo é ver o DVD do show, com uma excelente produção de palco (ligeiramente alusiva ao Kraftwerk), a qualidade sonora perfeita, o figurino finesse dos caras e o público tão elegante quanto. Eu ralei para achar isso no Torrent, e o link que baixei já expirou. Qualquer coisa, eu gravo para quem interessar...

Front 242 – “Moments”




De volta ao passado! A onda dos revivals ainda age como uma praga sem data para acabar. Sinal dos tempos, de que os velhinhos (adjetivo para qualquer um que tenha nascido antes dos 90’s, segundo os tempos atuais) têm pouco ou nada a dizer a não ser relançarem clássicos e deixarem as novidades para a garotada? É bem provável, e isso pode se aplicar aos belgas criadores da EBM (electronic body music): o Front 242 . Ao que tudo indica, ele preferem o conforto de andar sobre este tipo de terreno mais seguro e garantido contra críticas vorazes. O último disco inédito deles foi lançado em 2003 (“Pulse”), era apenas ok e demorou 10 anos para sair! Fora isso, o quarteto vinha desagradando os fãs ortodoxos (como eu!) ao insistir em tocar ao vivo suas faixas no mesmo formato registrado desde “Reboot: 98 ”. Os clássicos de outrora foram repaginados radicalmente para uma espécie de hardcore techno barulhento e repetitivo, que depunha contra o passado de glórias do grupo. Todos os detalhes dos arranjos e timbres foram aplacados por uma sonoridade acid, linear e chata pra burro em todas as músicas! Acho que a chiadeira foi tanta no ouvido deles, que agora os caras resolvem dar um mimo aos fãs com o recém lançado box “Moments”. Da primordial “U-Men” (1981) à recente “Together” (2003), são mais de 20 clássicos tocados ao vivo, próximos à maneira original, tal qual sugere o título da turnê que gerou este lançamento (“Vintage Tour”). É pra fã nenhum reclamar, ainda que a versão 2008 do mega-clássico “Headhunter” não chegue aos pés da energia contida no registro de “Live Code” (1995), que pra mim é ainda o disco ao vivo definitivo do Front 242 (em que se pesem as ausências homéricas daquele disco, devidamente resgatadas em “Moments”).

ELETRÔNICA HYPE

The Presets – Apocalypso


Posso jurar que o som do The Presets não tem nada a ver com o visú destes caras...

Tudo o que você ler nesta resenha pode resvalar em mofo. Afinal de contas, o último disco do duo australiano de synthpop The Presets , “Apocalypso ”, foi lançado há distantes três meses, e a cena eletrônica do país dos cangurus pode já ter sido deixada de ser hype há muito tempo - talvez algumas horas atrás – para dar espaço às novidades vinda de/da/do ... (preencha o espaço você mesmo, pois eu perdi o bonde da história). Agora, se você não se deixa levar por qualquer marola passageira divulgada por aí pela internet, eu ponho a mão no fogo por estes caras aqui. Não tem pra Pnau, Midnight Juggernauts, Cut Copy ou Bag Raiders nenhum não: entre os nomes mais hypados do tal synthpop australiano, o The Presets põe fogo nas pistas de dança de verdade, sem pudores indies (tais quais seus conterrâneos de cena), pois não tem medo de pesar o som quando lhe convém (como em "Kicking and Screaming" e em "My People"), fazendo o disco descer bem por inteiro. Em alguns momentos, os vocais e as melodias dos arranjos (principalmente em “This Boy In Love e “New Sky”) lembram um Depeche Mode classudo ou mesmo um Information Society quando estes resolviam mandar bem de verdade (tipo “What’s On Your Mind”, injustamente relegada à condição de trash hit 80’s). E synthpop por synthpop da cena do país do caçador de crocodilos que morreu com uma ferroada de uma arraia no meio do coração, o The Presets é o grupo que mais se aproxima do verdadeiro sentido deste gênero musical, ao mesmo tempo que o atualiza e o transforma em algo moderno e original.

Por falar em synthpop...


O cara aí da esquerda não é o Patrick Dempsey!

Outro dia eu estava ouvindo o duo norte-americano Chromeo , super hypado projeto de electro-retrô que rola atualmente. Ao mesmo tempo em que me divertia à beça com o som deles, me incomodava constatar que os caras emulavam 100% um tipo de tecnopop caricato que era datado já nos anos 80! Enquanto baluartes do primeiro escalão deste gênero como Depeche Mode, New Order e o pai/avô/Deus-Criador Kraftwerk inovavam a cada lançamento, uma turma da segunda divisão daquela época suava em baterias hexagonais vagabundas e sintetizadores baratos para tentar correr atrás dos mestres, gerando faixas tão divertidas quanto constrangedoras. Pegue aí o exemplo de gente como Spandau Ballet e Flock of a Seagulls. Esta leva de artistas ficou eternizada por carregar os nomes, as roupas e os penteados mais ridículos de todos os tempos, assim como tiveram pelo menos uma música registrada nos anais do tecnopop e que hoje são motivo de risadas em festas retrô. Pois é este tipo de som que o Chromeo quer reproduzir sem o menor pudor. Tirando a qualidade da gravação (com graves e médios prontos para tremer o chão das pistas de dança de hoje), esta dupla cara-de-pau e seus discos poderiam se equiparar ao som que o Ministry fez em seu primeiro disco, de 1983.


Este cowboy do inferno apocalíptico atual um dia foi vítima da moda...



O que esta pessoa viu na sua frente nos anos 80 para se transformar no cara da foto anterior?!?

Se hoje o grupo de Al Jourgensen é lembrado por ter criado a incendiária mistura de thrash metal com industrial e segue atualmente provocando abalos sonoros pesadíssimos, em 1983 o Ministry gravou um vexame, parecendo querer ser desesperadamente uma banda para tocar na trilha sonora de “A Garota de Rosa Shocking” (ou em qualquer filme adolescente genérico da época). Postas lado a lado, até que as três primeiras músicas de “With Sympathy” não fariam feio aos sons do Chromeo (ué, não deveria ser o contrário?). “Effigy”, com bons arranjos de synth e guitarras, “Revenge” e seu clima quase gótico, e o groove irresistível de “I Want To Tell Her”, que faria bonito na onda new disco atual, formam uma bela trinca inicial neste disco de estréia do Ministry. Mas o que se segue no resto das faixas é de constranger até mesmo ao Chromeo! Confie na opinião do próprio Al Jourgensen sobre este álbum: “Não valeria à pena nem ser roubado!”.

O TECNOPOP SANGUE BOM


O grupo belga Telex

Por conta de irresponsáveis como o Chromeo e também por causa do já longínquo hype do electroclash (foi em 2001, lembra?), o tecnopop tem sido sinônimo de uma época em que o bom gosto fora esquecido. Tamanho foi o estrago promovido por aquela gente esquisita e exagerada, que logo no início dos anos 90 o gênero musical movido à base de sintetizadores apareceu já de rótulo novo, o synthpop. Esta nova alcunha nada mais era do que a mesma coisa que o tecnopop, porém sob um estofo mais chique e menos espalhafatoso. Contudo, músicos de boas bandas do ressurgido pop de sintetizadores como De/Vision, Wolfsheim e Mesh - que, diga-se de passagem, passam batidas do hype do synthpop australiano de hoje - faziam referência não aos trash hits dos 80’s citados no parágrafo acima, mas sim a um pessoal do tecnopop que deixou algum legado respeitável a ser seguido. É por isso que lembrei com carinho de duas bandas ótimas dos anos 80: Telex e Moskwa TV (OBS: eu poderia citar também o excelente Ultravox, mas este e a carreira solo do ex-integrante John Foxx merecem posts à parte). Estes dois nomes participaram ativamente de minha pré-adolescência, ao lado dos óbvios Depeche Mode, New Order e Kraftwerk. Posso afirmar tranquilamente que faixas como “So Sad” e “Second Hand”, dos belgas do Telex (vale atentar que eles voltaram á ativa!), quando tocadas numa pista de dança de electro/synthpop de hoje (eu já fiz isso!), gerariam interrogações nos antenados de plantão, ávidos para saberem que banda nova estaria tocando. Já músicas como “Tell Me, Tell Me” e “Brave New World”, dos alemães do Moskwa TV (uma das crias do geniozinho Talla 2XLC), talvez agradem em cheio aos fãs de grupos que promovem o eterno revival do post-punk (como fizeram os noruegueses do Monomen em “Oscilate”) e que não resistem em soltar uma ou outra faixa lotada de sintetizadores oitentistas.

LOUNGES E GROOVES INSUSPEITOS

A música lounge/chill out virou rótulo suspeito para a trilha sonora de qualquer ambiente metido a besta. Há tempos que este tipo de som tem sido banalizado por cítaras indianas de araque, BPMs baixos e safados programados em cima de discos de música étnica de procedência duvidosa, e vez ou outra com alguma cantora brasileira de vocais neo bossa nova de sobrenome exótico, normalmente citando alguma cidade baiana ou carioca, cuja fama só engana a gringos sebosos sempre dispostos a chacoalhar os esqueletos com alguma world music devidamente europeizada para não agredir aos seus paladares. Separar o trigo do joio em meio a tanto curry e dendê falsificados requer um trabalhinho! E não vou negar o clichezão de assumir que curto sons mais light para embalar meu dia-a-dia com mais calma.

The Orb – “The Dream”


Este simpático senhor é responsável por alguns dos sons mais alucinógenos e originais que se tem notícia

Quando as primeiras raves surgiram na Inglaterra, na segunda metade dos anos 80, um sagaz indivíduo chamado Alex Paterson resolveu criar a trilha sonora para aqueles momentos onde a bombação já havia passado, mas as drogas ainda continuavam a fazer efeito. Era a hora de diminuir gradativamente o BPM, como que um espírito pilhado fosse expurgado aos poucos de seu corpo, sem acabar com a festa abruptamente. Reza a lenda que o hoje mega DJ Paul Oakenfold cedeu um espaço em uma festa sua ao tal do Paterson, que acabou concebendo o The Orb como o primeiro projeto musical dedicado exclusivamente aos chill outs. Tomando lições dos experimentos com música ambient promovidos por Brian Eno, das viagens mais progressivas e psicodélicas do Pink Floyd (David Gilmour declarou em 1993 que era fã do Orb!) e das chapações dub jamaicanas, Alex Patterson criou um som único. A música flutua pelos canais de som, mas também treme o chão e faz dançar. Nunca em qualquer de seus discos Patterson apelou para climinhas pseudo-trancendentais. A única certeza ao ouvir o som deste inglês doidão é que a viagem estaria garantida, mas o destino seria sempre para algum lugar diferente. Dito isso, é bom frisar que “The Dream”, seu lançamento mais recente, é o seu melhor disco desde “ Orblivion” (1997). Alguns climas iniciais nas faixas deste disco novo do The Orb podem sugerir alguma aula de meditação ou tai chi chuan. Mas os grooves e programações que entram a seguir podem fazer de um incenso um incêndio! De fato, a sonoridade de “The Dream” é mais dançante, vide as ótimas batidas de “Vuja De” e “The Truth Is...”. Contudo, os momentos espaciais estão sempre presentes, como em “The Dream” e “DDD”, como reza a cartilha psicodélica de estilo único nas produções de Alex Paterson. Aperte os cintos, senão teu corpo e tua mente vão loooooonge....

Nightmares on Wax – “Thought So”


O cabeça do Nightmares on Wax

Seguramente você pode baixar qualquer disco do projeto encabeçado pelo produtor inglês George Evelyn, mais conhecido como DJ EASE, que a tua viagem em busca de beats ora calmos, ora grooveados e sofisticados será recompensada. Que bom constatar que o Nightmares On Wax ainda tem gás pra acender e cozinhar bons climas e grooves sem apelar para os chavões que eles próprios involuntariamente ajudaram a reforçar. O estofo sonoro do recém lançado “ Tought So” possui uma batida ligeiramente hip-hop, com grooves graves e pesados. Contudo, a melancolia trip-hop e os climas sofisticados continuam presentes, como que se o DJ EASE quisesse sempre reafirmar que o seu Nightmares On Wax pertence – ainda que não seja um dos pioneiros – a uma rara estirpe de projetos fenomenais de down beats como Massive Attack, Portshead, Thievery Corporation e Moorcheeba.


Medeski, Martin & Wood – “Combustication remix EP”


Este trio arregaça com grooves animais e intricados

Um dos primeiros downloads que fiz em minha vida foi deste disco do trio Medeski, Martin & Wood. O meu interesse sobre eles veio após ler em algum lugar que existia uma banda que praticava exatamente o mesmo tipo de som que o Beastie Boys fez nas faixas instrumentais dos mega-clássicos “Check Your Head” (1993) e “Ill Communication” (1995). E que Combustication era um EP de remixes que estreitavam a relação do som do trio com o hip-hop e os grooves eletrônicos. Tendo à frente um Napster instalado no PC de um amigo meu, me vi num momento de mudança de hábitos irresistível e irreversível gritando à minha frente: “eu não vou mais gastar os tubos para encomendar discos importados? Agora eu só dou um clique e o disco vem pra mim, fácil assim?!?”, perguntei-me naquele dia. Pois eu baixei o disco. Um novo vício instalou-se em mim sem data para acabar. E o mesmo vício eliminou outro sem dó nem piedade. Nunca mais comprei ou encomendei um disco novo desde então, à exceção de uma ou outra ida a sebos de CDs usados.

Tenho guardado um dos primeiros CDs-R que queimei de um download que fiz. O disquinho está todo podre, com as beiradas descascando e fungos abrindo buracos pelo meio. Com a velocidade de resposta de uma busca no Google, não tive nem tempo de sofrer pelo disco em decomposição: baixei-o novamente e pronto. O sentimento de nostalgia sobre “Combustication” provinha de um clique no mouse, de um CD-R de qualidade ruim. Meus discos originais, que muitas vezes foram adquiridos com suor e espera por encomendas que pareciam demorar uma eternidade, hoje repousam em caixas e encartes que não são manuseados há anos, tais quais peças de um museu abandonado. Não tenho nem tempo de sentir saudades de algumas épocas em que a música existia fisicamente. Carrego sons no meu celular e me mando pra rua. Às vezes me bate uma sensação esquisita, de que se eu tivesse trocado a mulher que sempre amei por outra alardeada por aí como mais perfeita: sem reclamações no ouvido, sem cobranças, sem oscilações de humor... e também sem emoções marcantes e duradouras.