quinta-feira, abril 27, 2006

Balanço bom, balanço torto, balanço esquisito…



Não adianta! Quando o negócio é botar o povo pra suar na pista, nada melhor do que o balanço black vindo direto da origem. Produtores de música eletrônica suam seus dedinhos nos softwares de produção, mas só conseguem um resultado sacolejantemente bom quando bebem (sampleiam!) diretamente da fonte negra. E tome James Brown, George Clinto/Funkadelic, Earth, Wind & Fire, Cameo, Chic, Isaac Hayes… e também Tim Maia e Jorge Ben! O grande lance de ouvir um som contemporâneo é sacar de onde veio aquele sampler, aquela batida, aquele vocal. E saber também que tem gente maluca o suficiente para juntar este monte de referência e dar cria a uns troços estranhos e bem legais!

Tim Maia Disco Club! Presentão de aniversário de meu amigo Caio, que minha mãe, meu tio, o cachorro da vizinha e este que vos escreve não páram de ouvir, pirar e se contagiar. Eu conheci o som do tio do Ed Motta nos anos 80, aqueles baladões estilo final-de-noite-num-piano-bar-decadente, e só fui descobrir os potes de ouro do cara na década passada. E pensar que tinha vinil original da fase anos 70 dele dando mole na minha antiga casa... Enfim, vamos ao presente-passado-futuro: “A fim de voltar”, “Ascenda o farol” e “Sossego” são de rachar qualquer assoalho por aí, de igual para igual com papas da música black sacolejante norte-americana – as duas primeiras são disco music incandescentes, e a terceira, bem, é “Sossego”, porra! A híper dançante e instrumental “Vitória Régia, Estou contigo e não abro” faz a ponte para os baladões soul de “All I Want” (se mostrar este som p/ jovem pesquisador de som black por aí, o cara vai achar que se trata de algum clássico da Motown), “Murmúrio”, “Pais e Filhos” e “Se me lembro faz doer”. “Juras” recoloca o trem nos trilhos da disco - infernal!, e “Jhony” quebra tudo no final, com muito funk percussivo e fantásticos arranjos de metais e orquestra – presentes (e de autoria de Tim) por toda a parte do disco, diga-se. Quem sou eu de indicar algo tão bom e clássico assim! Neste caso aqui, é só para curtição das melhores!
*Este disco ganhou uma remasterização excelente, pois o som está muito nítido e forte, sem aquele ranço “magrinho” típico das produções brasileiras da época.

Jazz pra mim soa chato demais, na maiora das vezes que me dispus a ouvir. Aqueles troços tipo fusion e tal não entram na minha mente. Mas os balanços mortais da Blue Note são outros quinhentos! Órgão Hammond, baixo acústico, bateria suingada... tomei conhecimento daquela cepa através de discos de jazz-rap de gente como US3 e Digable Planets. Qual não foi a minha surpresa de saber da existência de um trio que reverencia aquele tipo de groove nos dias atuais? Medeski, Martin & Wood praticam uma espécie de acid-jazz-funk muitíssimo bem tocado (como é de praxe em formações do tipo), ora pendendo para o groove puro, ora caindo para a punhetagem instrumental. Os caras lançam disco quase que anualmente, e a maioria é muito boa, sendo que eu prefiro o lado mais balançado de, por exemplo, “Shack Man”. Encontrei esta belezura perdida num sebo no Centro de Vitória há alguns anos atrás, em versão nacional! Procure que você acha!
*Vez ou outra o M,M&W dá as caras em terras tupiniquins. Mês passado eles tocaram em Sampa com apresentações esgotadas semanas antes dos shows. Na próxima eu vou!

Pegue a Blue Note e o M, M&W, jogue tudo num tanque lotado de haxixe, fluído de bateria e cerveja, misture e bote pra dentro sem respirar! Vai dar uma congestão estomacal, mas também vai dar uma onda louca! Só esqueceram de chamar (samplear!) o Síndico Tim Maia! “At The Center”, disco mais recente da dupla de loucos de pedra vanguardistas do Meat Beat Manifesto (Jack Dangers e Jonny Stephens) é jazz-funk-breakbeat-dub-ambient alucinadamente dançante e, ãh, cabeçudo. Da mistura de hip-hop com industrial do começo (chegaram a gravar pela Wax Trax, conceituada gravadora de industrial de Chicago), passando pelo big beat antenado com o melhor produzido no final dos anos 90 (“Prime Audio Soup”, do álbum “Actual Sound & Voices”, fez parte da trilha de Matrix), ao jazz-electro-funk de “RUOK” (2003), o Meat Beat Manifesto sempre se mostrou inquieto a cada disco. Este álbum mais recente é capaz de provocar alucinações tanto balançadas quanto espasmos em ritmo de bad trip. É uma droga esquisita, de efeito dançante e conseqüências por vezes indigestas. Estou me arriscando a experimentá-la e até agora gostei!

quarta-feira, abril 05, 2006

Beco sem saída?


É produzir e mandar pra fora!
Foto by: Kalunga


É irônico notar que, aqui no Espírito Santo, não há uma cultura em si relacionada à música eletrônica. Num país sem memória, viver num Estado de população pouco numerosa é afundar de vez nos círculos provincianos que cultivamos desde sempre. O que era a ponta de lança de uma súbita e promissora novidade em meados de 2002, acabou por cair no esquecimento e por ser sugada quase que na sua totalidade por uma vertente solitária e totalitária. Até 2002, vá lá, 2003 também, Vitória tinha eventos que disputavam entre si a preferência do público que bancava a novidade, contando com ecletismo e muita boa vontade de quem os produzia e também de quem apenas queria se divertir. Techno, house, drum’n’bass e trance pareciam viver uma disputa saudável naquela época. Porém, a novidade passou. Sobreviveram aqueles que souberam canalizar os anseios de gerações específicas ainda mais novas em torno do que dá grana no bolso (não vejo nenhum demérito nisso, pois qualquer trabalho tem que ser recompensado), enquanto que todos os outros parecem viver de sobras, ilusões, ou de nada mesmo. O jovem de hoje (entre 18 e 25 anos) quer se divertir onde está bombando, seja numa boate badalada, seja numa micareta baiana. É um sintoma típico de gente normal de classe média e sempre vai ser assim em qualquer lugar. Este mesmo jovem agora se diverte - novidade! - também nas festas de psy trance. Os que optam por trilhar caminhos alternativos curtem o último hype do mês, de compratilhar arquivos novíssimos de Block Party e Arcade Fire, e de dançar em festas nostálgicas de uma época em que nem eram nascidos – os anos 80. E a música eletrônica, coitada, ficou perdida no tempo, virou som, acreditem, de gente velha?!?

Seria muito cômodo culpar o psy trance por este ostracimo para com as demais vertentes da música eletrônica no ES. A cena psy brasileira é idêntica em todo o território nacional, tanto em termos de público quanto de estrutura – uns maiores, outros menores, mas a postura em si é igual em todo o lugar. É uma cena independente com público de alto poder aquisitivo – um fenômeno sociológico a ser estudado! A forma com a qual as pessoas se aproximam do psy pode ser altamente questionável. Porém, o que não se questiona é o grau de profissionalismo acerca do que realmente interessa aos amantes de música em si: som bom e alto, decoração estupenda, e as maiores atrações mundiais do estilo batendo cartão nos festivais. É preciso botar e ganhar muita grana para sustentar algo deste nível. E o psy brasileiro (capixaba incluso) vive de uma forma totalmente independente a qualquer outro gênero musical. Talvez sua solidez fosse abalada se o suprimento de drogas lisérgicas fosse cortado de vez (eu tinha que soltar essa, hehehehehe...), mas o fato é que trata-se de, repito, um fenômeno sociológico entre jovens de classe média-alta brasileiros. A música eletrônica como um todo (techno, drum’n’bass, house, etc.) também já foi assim no Brasil, e aqui no Estado apenas ensaiou algo parecido. O que nos restou, capixabas, é trance, trance e trance.

Partindo daí, há aqueles que cairam na real e abriram as pernas para o mainstream, e embutiram seus anseios em noites típicas de boates badaladas regadas a drinks e azarações. Quem opta por viver disso aqui no Estado tem mais é que se adaptar ao sistema. Quem um dia sonhou em viver disso e manter algum tipo de integridade, ou passou a tocar psy trance ou largou dessa vida. Quem quer tocar sons diferentes da seara psy, tem que ralar! E quem somente curte estes outros sons diferentes parece que sumiu! Cadê aquela galera que freqüentava o Sala 11 e o Pub 455?!? O pessoal com mais de 25 anos que ia a estas baladas parece não ter tomado partido. Eu sei, parece papo de militante da Une falar em “tomar partido”. Mas, porra, estamos (eu, você que estiver lendo meu blogg, e o resto eu nem sei se existe mais...) ilhados (ops!) em parcas opções de se ouvir música eletrônica que não seja psy trance! E olha que quem escreve isso é um cara que poderia estar faturando bons trocos por DJ set de psy, na condição de veterano daquela cena.

Não toco mais psy por mera questão de gosto e por não me identificar mais com aquele público, e não por querer ser alternativo (algo que não enche o bolso de ninguém) ou qualquer coisa que o valha. Você, que gosta de techno, house, drum’n’bass ou o caralho-a-quatro-eletrônico - se é que você existe mesmo, saiba que tem gente tocando coisas diferentes na Serra (a galera de Ádamo e Anderson) e em bairros da Grande Vitória que saem do espectro de Praia do Canto-Jardim da Penha (DJs Cristiano e Mazzo). Fora os músicos veteranos e novatos daqui que vez ou outra fazem algum barulho bom produzindo sua própria música. É um exercício de paciência e, principalmente, persistência apostar em algo que parece estar caindo no esquecimento. Essa tal de música eletrônica deixou de ser moda por aqui, e virou demodé gostar disso entre os “jovens”. Tudo bem, o negócio é reunir quem gosta, partir para locais menores e com público realmente interessado. É pescar alguns dinossauros aqui e ali, e correr atrás daqueles “novatos” que gostam de algo que já não é mais sinônimo de “novidade”. Partir praticamente do zero.


Há opções, porém sem hype e para públicos mais seletos – Piscina Lounge Orchestra, Café Touché, 31/03/2006.


A banda Control Z, formada pessoas de idades entre 16 e 19 anos, está produzindo o som deles de maneira instintiva, sem seguir modas por aí. Teacher's Pub, 04/04/2006.
Fotos by: Kalunga

terça-feira, abril 04, 2006

A Lei

Em 1997 uma bomba suja e eletrônica tomou de assalto o Mundo Pop. Eram quatro malucos com pose (cyber) punk e batidas irresistíveis esfregando na cara dos incautos sobre o “futuro da música” e a “morte do rock and roll”. Besteira! O maior erro dos leigos foi tentar enxergar no Prodigy o futuro de alguma coisa, e o fim de outra. Após o lançamento de “The Fat of The Land”, tinha jornalista comparando-os até com os Beatles (é sério)! Logicamente, tamanho hype criou um retrocesso que gerou antipatia em roqueiros radicais, e uma mega-expectativa em torno do próximo trabalho da “banda” (aspas são necessárias). Meus amiguinhos, o Prodigy é um projeto tão única e exclusivamente encabeçado pelo seu fundador, o produtor Liam Howlett, direcionado às pistas de dança desde o início, que data de 1990. O poder de fogo de bombas atômicas como “Breathe” e “Firestarter” foi potencializado na época certa, da massificação mundial da música eletrônica que o próprio Prodigy ajudou a arquitetar. Guitarrista e baterista ao vivo eram artifícios para enquadrar o grupo no esquemão pop. Mas Liam Howlett fez questão de afirmar o propósito de sua criação, ao lançar logo após o seu estouro o mix-set “Dirty Chamber Sessions – Vol1”, um sensacional compêndio contendo a discotecagem de tudo o que influenciou a mente deste talentoso DJ/Produtor – de Beastie Boys a Sex Pistols, passando por Bom The Bass e Chemical Brothers. A demora em lançar material novo fez a poeira baixar e, mesmo assim, “Always Outnumbered , Never Outgunned” (2003) foi malhado de cima embaixo. Porra nenhuma! É um puta disco para as pistas, com breakbeats (sua marca mais famosa) convivendo harmoniosamente com timbres electro/disco punk matadores. Para quem já foi dono do mundo, uma volta às melhores pistas de dança não era considerada digna pelo panteão pop. Não sabiam o que estavam perdendo...

Porque estou escrevendo sobre o Prodigy?!? Simples: trata-se do lançamento da coletânea em CD e DVD “Their Law: Singles 1990-2005”. Está tudo lá. Da zoeira breakbeat/techno hardcore do primeiro álbum “The Prodigy Experience”, aos petardos de “The Fat...”, passando pelo combustível devastador de “Music For Gilted Generation” e o (ainda) pop e atual “Always...”. No meio da dance music, dois ou três anos possuem efeito devastador do tempo sobre a música. E a produção do Prodigy às vezes sucumbe ao datado. É fato que DJs conceituados tenham receio de tocar o som de Liam Howlett, pela exposição popular de sua música, e que por isso mesmo esta tenha sido execrada pelos circuitos undeground, deixando de se tornar referência neste segmento. Mas um título ninguém discute: Prodigy é discoteca básica em música eletrônica. Que, por sinal, um dia puxou o pé do Mundo Pop em algumas madrugadas da década de noventa, jogando-o no meio de gente esquisita que, de uma hora para outra, viu-se como modelos a serem seguidos. Ame-os ou odeie-os, mas Prodigy nas caixas de som tem o poder de ser A Lei nas pistas de dança!