terça-feira, abril 03, 2007

O Indie é Pop...


...e o Pop não poupa ninguém! Os Klaxons já vão tarde?!

Fenômeno louco esse dos anos 2000, cujas novidades aparecem e somem na mesma rapidez em que sua conexão de banda larga demora para carregar uma página da internet. Faça um paralelo entre o que se chamava de “indie” em meados dos anos 90 e o mesmo nos dias atuais. O cara que habitava este universo, até dez anos atrás, invariavelmente era uma figura meio nerd, usava roupas parecidas com as de um professor de física nuclear, e consumia cultura pop de acordo com o que deveria ser a “nova onda do momento” até alguém chegar lá e escrever uma matéria num grande jornal e/ou revista tupiniquim. Aí perdia a graça, pois a panelinha de amigos antenados que sabiam ler a Melody Maker e o NME sem precisar da ajuda de um tradutor simplesmente largava de mão sua banda-preferida-das-últimas-semanas pelo simples fato de que os reles mortais poderiam ouvir tal som e, pasme, comprar o disco na loja da esquina!

Hoje os tempos são outros. Basta um clique que você baixa o som que quiser. A informação se democratizou. E esta democracia está se rendendo aos efeitos mais rasos da Indústria Cultural. O jovem que cresceu com internet rápida boceja o indiferente sabor da banalidade tal qual o mesmo indivíduo que cresceu tendo TV a cores em casa como a coisa mais normal do mundo. Entre perfis no Orkut, vídeos no You Tube e downloads que vão lotando o HD de seu mp3 player, os mesmos jovens engolem a informação massificada sem perceber. Expõem suas entranhas pessoais (ou mentiras pessoais) nos seus perfis de “sites de relacionamentos” (termo já démodé este...) como se fosse absolutamente corriqueiro das pessoas saberem se você está namorando ou não, se você saiu ontem e com quem, se você tem a obrigação de ter centenas de “amigos virtuais” e de participar de comunidades infinitas – estranho é quem não adere à massa expondo sua carinha em perfis sempre positivos e com defeitos convenientemente aparados. O excesso de informação está diluindo a utilidade real da própria informação. Você está ao passo de um clique no mouse para conhecer universos distintos, o seu interesse por determinados assuntos pode se desdobrar numa teia (web!!) infinita de possibilidades para ampliar seus conhecimentos e ainda pode desenvolver uma espécie de “filtro” para discernir o que presta e o que é lixo. Mas você cresceu com um PC potente e uma conexão veloz. Vai escrever “você é legal” como uma criança sendo alfabetizada (vc eh legau). Vai consumir e esquecer com a mesma rapidez. Vai sacar que ser “indie” hoje é ter o poder da banda larga nas mãos, de está em sintonia com o Mundo Pop – ainda que este utilize-se de trejeitos e maneirismos que eram exclusivos dos índios, ops!, “indies” de outrora.

Veja bem: o Santo Graal do Pop atual se encontra nos anos 80. A década dos mullets, das blusas com ombreiras, do gel New Wave, das calças baggy e cintura centro-peito - tudo o que fora mais ridículo e exagerado em todos os tempos, com certeza! Mas também era o tempo de fusões musicais inimagináveis em décadas anteriores. Uma banda de pegada legitimamente rock, por exemplo, poderia usar bateria eletrônica (aquelas hexagonais!) e teclados portáteis (estilo Roupa Nova!) sem o menor pudor. Era o pop bem feito da época, produzido para dançar e cantar junto melodias que, admita, os anos 80 souberam produzir de uma maneira bem própria. Logicamente, existiam bobagens inomináveis, daquelas que infestam hoje as festas estilo “Thrash 80’s” – piadas de extremo mau gosto sendo contadas repetidas vezes. Separando tudo isso, a entrada dos anos 2000 ofereceu o óbvio reciclo de vinte anos atrás, filtrando os excessos e buscando o refrão e a batida dançante que foram perdidos no grunge e no nu metal, fenômenos pop anteriores que já apodrecem no esquecimento. Os pioneiros de hoje, que deram largada a esta reciclagem, agora estão vendo bandas copiando o que já era copiado, assim como o público que adota os plagiadores do plágio, deixando pra lá o aprofundamento da informação, que está ali, ao sabor de um link! O que necessitava de uma pesquisa musical mais acurada, deu as bases para aqueles que pegam o produto já embalado e produzido em série. E os mesmos re-embalam o tal produto com recheio semelhante e só mudam o embrulho, lançando-o novamente na praça com o selo de “novidade”. Olha aí o exemplo atualíssimo da tal da “new rave” que não me deixa mentir, e que, após nem bem aparecer ao mundo, já é dada como morta por seus “fundadores”.

Mas, e os “indies” do começo do texto, onde se encontram atualmente? Nas paradas de sucesso! O que antes era sinônimo de informação suada, codificada e pouco compartilhada, agora é o mainstream, é o que dita comportamentos, o que você vai vestir e ouvir. A geração que cresceu com downloads nas mãos é quem tem o poder também! Se você veio antes dessa gente, que viu na internet a tábua da salvação dos seus sofridos reais minguando nas cotações em dólar para conseguir um som antes de todo mundo, que adorava ter o prazer de poder tirar onda que descobriu uma banda antes de sair na coluna do Lúcio Ribeiro, agora se vê atropelado pelo batalhão dos “indies atuais” e suas conexões de banda ainda mais larga, com disposição jovial de fuçar a internet atrás de novidades que nem elas - as “novidades”- ainda sabem que surgiram ao mundo. A prática de descobrir um novo som antes de todos banalizou-se. Na verdade, o espertinho que acha que está antenado com as últimas tendências, está mesmo é reciclando uma informação que fora jogada na rede puramente por ser “nova”. Alguém aí, de fato, presta a atenção com aprofundamento mínimo nos milhares de sons que entopem seu IPod? “Eu presto sim!”, dirá a maioria. Serão os mesmos que afirmam que os 1.328 amigos virtuais no seu Orkut são “meus amigos mesmo, de verdade!”. Você não está sendo alternativo ou “indie” a nada: você segue a massa! O “indie” de hoje é produto do “Pop do Bem” (há muita coisa boa, não tenha dúvidas) dos dias atuais, que divide ombradas e desmanches em suas franjas cuidadosamente despenteadas com rappers falcatrua, boy/girl bands armados por gravadoras e divas de araque – “O Pop do Mal”, propriamente dito. O “indie” de 2007 seria equivalente ao metaleiro poser e de cabelo de poodle dos anos 80, ou ainda um tipinho afetado tal qual gente como Boy George (Culture Club) ou os moços(as) do Duran Duran. Gente que, por sinal, hoje é bem lembrada por seus méritos como compositores pop - depois, [e claro, de rolar uma bela peneirada. Veja bem, meu caro “indie 2007”: não há demérito algum em ser “pop”. Afinal de contas, fazer as massas cantarem junto uma canção é tarefa para poucos, ainda mais se o som vem com alguma consistência, mesmo que despida de ousadia. Vai ser cantado, consumido, esquecido e lembrado vinte anos depois. Só não diga que você é “alternativo” a alguma coisa.

Exemplos práticos

Veja aí um exemplo de atualidade se sobrepondo ao que já foi considerado atual nos mesmos anos 2000, e que estão lançando discos hoje: Klaxons (disco de estréia) e Kings of Leon (terceiro disco). O som das duas bandas não tem nada a ver, com certeza. Mas há aí um paradoxo irresistível pedindo comparações. O primeiro fez fama com declarações arrogantes, a cunha de um novo rótulo (new rave), e conseguiu um contrato sem ao menos ter músicas suficientes para encher um EP (isso eles disseram em entrevistas). A tal da “urgência pop” clamou por um álbum em nome de cifras para as gravadoras, mas o público conquistado com uma ou duas músicas já os dava como “ultrapassados” quando soube do lançamento de seu primeiro disco “inteiro”. Uma audição cuidadosa do álbum (eu fiz isso!) revela um grupo promissor, divertido, mas carecendo ainda de uma personalidade musical mais forte do que suas declarações mal-criadas na imprensa. E o pior: os próprios deram fim oficial ao hype criado por eles mesmos! Justo eles, que apareceram ao mundo se auto-proclamando como a “novidade mais atual do momento”?! Já o Kings of Leon encontra-se no momento sem o auxílio luxuoso do hype que os cercou poucos anos atrás. Também, pudera: seu som, uma espécie de southern rock anos 2000, chegou como “novidade” para as gerações atuais, mas revelou mais pegada, mais consistência, e menos saco para dançar conforme a velocidade diária das informações recentes. Na boa, mas o som do Kings of Leon já nasceu velho, talvez eles mesmos nem tenham percebido isso. Caíram nas graças dos geradores de hype e depois foram relativamente esquecidos pela massa. Foram incensados pelo mesmo tipo de gente que achou que o som, por exemplo, do Wolfmother era novo e se esquece (repito: basta um clique no mouse!) de que há todo um cenário stoner rock (estilo onde a banda citada se encaixa melhor) vivo há mais de 15 anos e que se baseia em gente ainda mais antiga como Black Sabbath, Blue Cheer e Led Zeppelin. Isso é ruim? Creio que não. Se os Kings of Leon estão no terceiro disco (que é muito bom!), é sinal de que alguém aí sustenta uma carreira que parece ultrapassar a superficialidade. É só ver o caso dos White Stripes (e dos Raconteurs por tabela) para constatar que é, sim, possível criar consistência sonora em plena era do download, sobreviver ao hype de outrora, conquistar e manter novas e antigas gerações. A informação, hoje, exige quase sempre um mínimo esforço para achá-la. Mas nada nesta vida perdura sem um esforço considerável.