segunda-feira, julho 11, 2005

Alguns Sons...

Ouvir música o tempo inteiro: este é um vício pessoal incurável e que não tenho o menor problema de lidar com ele. Qualquer coisa que eu faço é desculpa para botar um disco para rodar. Às vezes eu estou bêbado na balada e vou para casa de repente para aproveitar a alteração de meus neurônios curtindo um som no fone de ouvido. Mas eu não gosto de absorver clichês do tipo “voz-e-violão para namorar” ou “heavy metal quando estou com raiva”, ou então o clássico “sons tristes para dias tristes e chuvosos”. Porra, eu vou ouvir som sombrio e deprê quando estou feliz! Música para mim desperta diversos sentimentos sem necessariamente definir um padrão. Tem coisa que eu ouço e nem sei explicar o porquê. Acho que já estou teorizando demais. Ontem cheguei meio (totalmente...) chapado em casa, fui ouvi alguns sons, digitei algumas coisas que acabaram dando pau no computador me fazendo perder tudo. Cada som estranho...

Dub War - Um som que conheci meio que por acaso (uma pequena e superficial resenha na Rock Brigade) e que se tornou um de meus favoritos de sempre e também o de alguns poucos interessados – seria uma cult band? Dub/ragga jamaicanos com o que havia de mais moderno no rock pesado de sua época (dez anos atrás). O vocalista Benji é um dos melhores de sua geração, uma improvável mistura (acreditem!) de Bob Marley, Michael Jackson e Corey Glover (Living Colour) a serviço de belas melodias e grunhidos raivosos. “Pain” e “Wrong Side of Beautiful” são discografias obrigatórias para quem quer ouvir boa música em forma de algo original. E o disco de remixes dos caras, “Step Ta Dis”, é o que vem me alucinando atualmente. Versões jungle/drum’n’bass/hip-hop/breakbeat (Aphrodite, Mo’ Wax, DJ Rap, entre outros) ferradonas e com particularmente uma obra-prima da reconstrução de uma música: “Silencer”, que se transformou num dub/funk com baixão na frente, órgãos hammond no fundo, uma interpretação vocal de arrepiar, tudo isso realçando a beleza de uma canção numa versão que supera a original!
*A propósito, o Dub War acabou e voltou na forma do Skindred: nu metal à Slipknot liqüidificado numa nuvem de fumaça jamaicana.

Sonic Cube - Música eletrônica para pistas de dança e sem vocais. Tem gente que só consegue gostar estando drogado. Tem gente que gostaria de ver este tipo de música morto e enterrado. Eu gosto tanto quanto qualquer “clássico do rock” que tem por aí. Fazer o quê? Este disquinho alemão é um som fino, bem produzido, trance/house progressivo dos bons, sem piques bombásticos nem melodias óbvias. Eu me emociono ouvindo este som no meu dia-a-dia. E não sou um robô!

Killing Joke - E pensar que eu tenho o “Night Time” há dez anos e só agora fui me dar conta de que se trata de um clássico do disco punk antes mesmo deste rótulo surgir. Fãs de última hora de Franz Ferdinand (banda excelente, diga-se) poderiam escutá-lo junto com outros álbuns de Talking Heads, Psychedelic Fürs e Gang of Four para aprenderem mais sobre suas origens. É aquele sabor oitentista cujas melodias singulares grudam na mente de imediato porém desprovidas daqueles arranjos plastificados típicos do pop da época. A propósito, a faixa que encerra o disco, “Eighties”, é a fonte de um dos maiores plágios da história da música. Kurt Cobain inclusive pagou aos caras do KJ para não ter maiores problemas...

Red Snapper, Thievery Corporation e Nightmares on Wax - Sabe aquelas vertentes de música eletrônica típicas de publicitário metido a bacana que o mané do Luciano Huck divulga no seu programa? Pois é, aqueles rótulos chiques tipo lounge/chill out/nu jazz podem lhe provocar cefaléia se combinados com a inevitável tríade sempre sugerida de canapés/champagne/vernissage que embalam o imaginário deste tipo de gente. Pois fique sabendo que, apesar disso tudo, existe uma turma que faz música que presta neste terreno. Climas de acid jazz, vocais femininos doces e abafados, ruídos de vinil (o velho é moderno, saca?), blips e póings aqui e ali, scratches e um bom gosto absurdo estão contidos no pacote musical que Red Snapper, Thievery Corporation e Nightmares on Wax sabem produzir de forma magistral. Vá para Ibiza com estes discos na mala e mande o Luciano Huck se foder!

Yazoo, Shrieckback, Ultravox, Yello, Human League... – Quer electro? Vá direto à fonte! Este gênero musical surgiu nos anos setenta, tomou sua forma definitiva (o technopop) nos anos oitenta, caiu no ridículo nos anos noventa, e ressurgiu ultracaricato no começo desta década sob o rótulo de electroclash. À primeira ouvida, taxei esta onda atual como uma porcaria apelativa e mal produzida propositalmente. Hoje o electro atingiu maturidade e rosto próprios, pois os climas retrô e modernos se misturam saudavelmente e acabam produzindo resultados arrasadores tanto nas pistas de dança quanto no cd-player de seu quarto. Os bambas atuais do estilo só saem perdendo quando tentam se equiparar à força melódica de seus pais (tios? avós?) dos anos oitenta. Coloque “Emerge” (do Fischerspooner) ao lado de “Situation” (Yazoo) ou “Don’t You Want Me” (Human League) e comprove. É covardia.
*Não preciso nem citar gente como New Order, Depeche Mode e Kraftwerk, pois eles estão acima de qualquer rótulo.


Eu ainda estou ouvindo uns troços esquisitos que são novos para mim ou que ainda estou tentando entender há anos. Umas paradas tipo Laibach, Test Dept., Einsturzende Neubaten, Clock DVA, Cabaret Voltaire, DAF... Quem tiver paciência de monge tibetano lerá algo sobre estas coisas por aqui.

*Não estou com saco para colocar links em todos os sons e referências que citei neste post. Vá direto ao All Music e ao CD Now. Para quem (ainda) não conhece, o primeiro é uma fonte riquíssima e completa (a maior na web, que eu saiba) sobre praticamente todos os gêneros musicais existentes e contém discografias, estilos, resenhas e links. O CD Now eu utilizo para ouvir trechos das músicas dos discos consultados no All Music – eu acho quase tudo lá.

quarta-feira, julho 06, 2005

Preguiça Virtual


Menos cabeças, mais chances de informar?
Foto by Kalunga


Uma das maiores frustrações para uma banda com repertório autoral que esteja começando suas atividades em público deve ser quando há na platéia aqueles indivíduos bêbados, burros e desprovidos de noção crítica que ficam gritando “toca Raúúúúllll” mesmo que o som dos músicos em questão seja um punk rock ou um forró dos brabos. Se a banda investe em segmentos musicais mais alternativos como, por exemplo, heavy metal, hardcore e indie rock, o apelo de um cover pode se justificar para situar o público com o som proposto, mas também pode mal acostumar os (muitos) chatos de plantão que só lembrarão do cover tocado e que não farão a menor questão de prestar a atenção em suas composições próprias. Mas seria uma pretensão utópica se o músico esperasse que a platéia esteja sempre bem informada e aberta a novidades. Cultura e informação numa sociedade de massas (todas?) é sempre uma exceção. Porém, os canais de busca para tal estão muito mais acessíveis, abrangentes e interligados. Só não absorve quem não quer.

Este é o ponto crucial deste texto: a passividade dos indivíduos que têm em suas mãos todas as ferramentas necessárias para abrirem seus leques de conhecimentos mas simplesmente investem sua procura no que já lhes é familiar e restrito. A internet, na minha opinião, é o meio de comunicação e propagação de informação mais completo que existe. Nela estão texto, imagem e som totalmente integrados entre si, interativos ao gosto do internauta que pode, através dos mecanismos do hipertexto, entrar numa teia de referências infinitas a serem pesquisadas. Ferramentas como bloggs e fotologs podem se tornar instrumentos para divulgação de conteúdos sérios e de linguagens totalmente novas (por favor, não estou me referindo ao analfabetismo digital de quem escreve coisas como “aki, eh, brigadu”) além do uso tradicional estilo “diário virtual”. Só não aproveita mais profundamente quem não quer. E a maioria não quer mesmo.

Às vezes eu me irrito radicalmente quando estou mandando um som e vem um(a) ser totalmente pilhado(a) falando pra mim: “acelera aí, toca um trance!!!” – isso quando está rolando um breakbeat (um som totalmente nada ver com o outro), por exemplo. É besteira, eu sei. Quem se expõe ao público tem que ter jogo de cintura para este tipo de coisa e a platéia não tem a obrigação de saber sobre tudo o que você está tocando. Mas aí surge outra questão: trata-se de um público específico (o do trance) que é predominante das classes A e B e, pelo grande número de comunidades virtuais existentes sobre este segmento, trafega pela internet com toda a desenvoltura permitida pela conexão de banda larga. E a maioria esmagadora só perpetua um tipo de trance, um tipo de atitude, ignora completamente as variações um gênero musical eletrônico tão rico quanto os seus paralelos (techno, drum’n’bass, house, breakbeat, etc.) e que só parece curtí-lo sob efeito de substâncias químicas ilegais. Pronto: estou julgando as pessoas! Os incomodados que se mudem, provavelmente me diriam. E eu mudei! Quero distância desta porra!

Até uns dez anos atrás a música alternativa (seja ela eletrônica ou acústica) tinha que ser absorvida por meio de fanzines (xerocados) e trocas de material por correio, telefone ou pessoalmente. Lembro-me que, no começo dos anos noventa, ouvia os diversos programas de dance music e rock pesado que existiam nas rádios daqui para conhecer novos sons e depois procurá-los em alguma das poucas lojas importadoras de discos. Em alguns casos o nome do selo/gravadora poderia servir de base para investir em bandas de seu catálogo - Alternative Tentacles e Wax Trax, por exemplo, foram e ainda são uma fonte absurda de novidades para mim. Muitas vezes eu olhava para o catálogo de discos importados da loja e atirava literalmente no escuro e sem conhecimento algum sobre o som que iria encomendar. Isso tudo que escrevi não se trata de nostalgia barata. Simplesmente me considero privilegiado de ter vivido esta época sem as facilidades da internet para cultivar este ímpeto por procura de informação mais detalhada. Também não sou purista e justamente o contrário que eu venho a pregar neste texto.

Meu primeiro contato com o Mundo Maravilhoso do Download se deu no meu local de trabalho em março de 2001, quando acessei pela primeira vez aquela ferramenta fantástica que era o Napster. “O que é isso, meu deus??!!”, pensei na hora quando me dei conta de que centenas de discos (e singles, Eps, ao vivo piratas...) que sempre quis ter estavam ao alcance de um clique ou de uma procura mais paciente. Depois vieram Audiogalaxy e Soulseek (eu parei por aqui, pois há quase dois anos que eu não tenho estas maravilhas diretamente em minhas mãos – um junkie sem o seu vício). Só entrei nessa de “DJ” porque pude pesquisar mais a fundo os sons que curtia (o Tourco foi o responsável pelos primeiros downloads que utilizamos em nossas festinhas, isso em 1998). E hoje me deparo com vários DJs daqui que simplesmente começaram a ouvir determinado tipo de som desde ontem e não se aprofundam no básico de sua história, cultura e possibilidades, mesmo com o singelo alcance de um clique virtual. O mesmo ocorre com trocentas bandas iguais que povoam o undergráudi local. Sinceramente, estou ficando velho demais para tentar mudar o mundo à minha volta. Uma pistinha pequena num bar perto de casa para eu tocar meus sons para amigos e interessados, 20 reais por noite e minha cervejinha sempre gelada já estão de ótimo tamanho! O prazer que eu teria com isso não demanda grandes multidões. Eu não vivo disso mesmo...

*A idéia deste texto partiu de um post publicado no blogg de meu amigo Taylor.
**Eu citei trance justamente por representar o contexto restrito ao ES. Em São Paulo, onde estive por todo o ano de 2004, pude perceber o mesmo tipo de bitolagem em diversos segmentos, principalmente house, techno, electro e indie rock. Mas o trance ainda se sobressaía mais que os outros nesta questão por agregar um público que nunca ouviria música eletrônica por outros meios que não fossem pela combinação “ecstasy-luz-negra-som-de-fácil-apelo”. Mas há um movimento em torno dos sons progressivos (mais lentos e trabalhados) do trance em SP que vem provando que BPM rápido nem synth melodies óbvias sejam sempre necessárias para uma pista bombar – a noite “Up Grade” das quintas-feiras no D-Edge é a prova disso.
***O mesmo (“bombação vs apelação”) vem ocorrendo com o público habitual do techno, que vem se cansando de esbarrar em gente travada na pista e está procurando pelos beats mais lentos e refinados da vertente minimal.
****Eu gosto sempre de lembrar duas bandas de amigos meus que se arriscam a tocar um som bom e diferente do usual em seus segmentos. O SMD (Silence Means Death) e o Tractorbilly tocam heavy/rock moderno e punk/rockabilly, respectivamente, num meio onde todo mundo só quer saber de urros e vocais estilo pavão no cio ou melodias chorosas lamentando o fora dado pela ex-namorada. Mas eu só vou aos shows deles porque são meus amigos, pois sempre tenho que aturar bandas horríveis para tal. Por favor me indiquem se há mais gente produzindo algo legal e que fuja do lugar-comum! Mas é preciso ter boas canções e um mínimo de apuro técnico e melódico, pois do contrário eu pego o exemplo do Terrorturbo: proposta radicalmente diferente e até mesmo original, mas com resultados horrorosos...