quarta-feira, junho 01, 2005

Computadores Fazem Arte – Parte II: O Questionário


A minha história começou quando este disco foi lançado. E a história de outras três pessoas segue logo abaixo.
*Imagem by CDnow.com


O confronto de idéias e de gerações que a música eletrônica provocou há mais de dez anos atrás, quando de sua invasão definitiva, já faz parte de um passado cada vez mais distante. É absolutamente enfadonho afirmar atualmente baboseiras do tipo “o rock morreu” ou que “o moderno hoje é fazer música eletrônica”. Trata-se de uma realidade presente, sempre atualizada e de mãos dadas com a evolução da tecnologia e do pensamento de Inteligência Coletiva (Pierre Lévy) - é uma agregação de valores e não de uma separação de pensamentos. E um dos pilares mais fortes desta “nova realidade” (nos padrões evolutivos atuais, esta realidade já é antiga) é a híper-informção promovida pela internet. Muita banalidade é despejada neste canal de comunicação mas, ao mesmo tempo, quem busca conteúdo produtivo enxerga um vasto e inesgotável oceano de possibilidades de democratização e de expansão da informação.

De alguma forma, os três indivíduos escolhidos para este trabalho que realizo se encaixam no perfil influenciado pelos fatos descritos acima, sempre revisando conceitos para se adaptarem e tirarem proveito de novos conhecimentos ou simplesmente tomando alguma iniciativa a partir justamente da citada via de informação. Todos estão envolvidos com a música eletrônica em um de seus meios mais profundos: produzindo! E da forma mais independente possível, sem grandes mídias e grandes gravadoras por trás, fuçando na net as informações, os meios, a divulgação, a evolução. São três cabeças diferentes unidas pelo prazer de darem vazão aos seus pensamentos criativos de acordo com meios de produção cada vez mais democráticos.

Renato Tanure, o DJ Tourco, é um amigo de longa data. Eu o conheci como músico (baterista) de bandas de baile e também como pandeirista de grupos de samba e confesso que na época não imaginaria alguém como ele, com formação musical, poderia se interessar por música eletrônica. O resultado foram as primeiras festinhas em que começamos a botar som juntos, isso lá por 1997, e o conseqüente abandono (parcial) dos instrumentos acústicos por parte dele em prol da aquisição de meios de produção digital. Paulo Bolzan, o DJ Carranca*, que conheci alguns anos depois, também possui história parecida, tendo largado o contra-baixo (e diversas bandas ao longo do caminho) para investir nos bits eletrônicos – atualmente faz a cama eletrônica em forma de Live PA para a banda NaPalma. E Sybel Calmom, o DJ Sybel, que eu conhecera mais recentemente (há uns quatro anos), surgiu como uma figura (e parceiro em diversas festas em comum) sempre aberta ao conhecimento e à troca de informações sem preconceitos. Todos demonstraram um extremo prazer de compartilharem suas experiências e as verem divulgadas por minha pessoa. Não preciso nem dizer que não ganho nada com isso, a não ser a satisfação pessoal de dar valor a quem está inserido num universo do qual vivo com paixão há muito tempo.

Entrevista (realizada individualmente por e-mail):

The Flame Job: Desde quando está envolvido com produção de música eletrônica? O que lhe motivou a buscar este caminho?

Tourco: Desde 1999. A minha principal influência de produção foi o Salla 11 (estúdio da banda Zémaria), onde vi as máquinas funcionando pela primeira vez. Senti que, pela minha base de engenheiro e baterista, que a música eletrônica seria um caminho muito mais fácil que a composição convencional, pela interação entre ritmo, seqüências e tecnologia.

Sybel: Estou envolvido desde muito novo quando comecei a estudar piano na Escuela Classica de Barcelona-Espanha (Sybel é de origem espanhola). Nesta época a musica eletrônica lá era tão comum lá quanto carnaval aqui e aquilo me despertou um grande interesse pois sempre me perguntava: ‘como fazem tudo isso?’. Assim fui me dedicando e aos 19 anos comecei a produzir sem parar porem ainda não profissional! Hoje, aos 25 anos, tudo mudou e acabei me tornando DJ também, pois queria tocar o que eu produzia junto com as produções de outros.

Carranca: Trabalhei por alguns anos na produção de spots publicitários, brincando de fazer música e comecei a levar a coisa mais a sério há uns dois anos, quando o “Professor Tourco” me aplicou em alguns dos softwares de produção musical - que ainda uso! Depois de ter largado várias bandas “convencionais”, a possibilidade de fazer música sozinho e não ter que conviver musicalmente com qualquer ego que não o meu – pelo menos durante o processo de composição – foi a principal motivação.

TFJ: Quais as ferramentas (softwares e hardwares) que você utiliza para produção?

T: Hardware Micro Desktop com placa de som Audiophile, Notebook com Controlador e Placa USB Hercules DJ Console, par de CDJ700S com mixer Behringer VMX200, synth JP8000, mesa Mackie 1202VLZpro, amplificador nashville NA2200, caixas de som Technics 3 vias. Software Cubase, Reason e um monte de plugins e samples.

S: Na parte de softwrwares utilizo atualmente Reason, Cubase SX e VST IntrumentsDe hardware tenho um synth yamaha psr 420 com MIDI .

C: PC Notebook HP Pavillion 7000, controlador midi e audio surface edirol UR 80, Live, Reason, alguns Vstis, Cubase SX. Descomplicado!

TFJ: Possui alguma formação musical? Se possui, como esta lhe ajuda na hora de produzir? O que tem a dizer para quem também não toca algum instrumento e mesmo assim quer produzir música (esta pergunta vale para os dois casos)?

T: Sim, sou percussionista e já fui baterista. Ajuda a seqüenciar batidas e fazer loops "on the fly", além de uma boa noção de sincronização. Se você não toca um instrumento, faça música com samples ou então chame algum amigo músico para gravar coisas para você, caso não ache o sample "perfeito". Lembrando que um sample "copiado" diminui originalidade de seu trabalho...

S: Bom, minha formação musical começou aos 11 na Espanha com piano! Daí parti para o teclado porque queria fazer algo mais interessante, pois todos eles (os professores de piano) só te ensinavam a tocar o que era dos outros e eu queria criar as minhas coisas!! A formação musical me ajudou muitíssimo e recomendo a todos sem exceção. Não acho que quem não a tenha não possa ser bom produtor, porém tudo é esforço e dedicação!! Recomendo!

C: Toco contra-baixo há uns dez anos, mas sei só o básico de teoria – não leio partitura nem sou versado nas complexidades da teoria musical mais aplicada. Tenho uma aproximação mais intuitiva. Se ajuda? Ajuda sim ter alguma noção de teoria musical, já que os softwares de produção utilizam alguma coisa dessa linguagem – mas isso de qualquer forma não é pré-requisito. Se você não toca um instrumento mas possui alguma sensibilidade musical, fuçando já se chega em algo.

TFJ: O que você acha da distribuição gratuita de música e softwares na internet? O que teria a dizer se alguma produção sua estivesse sendo compartilhada sem autorização?

T: Sou a favor, desde que mantenham a qualidade (Kbps) e os créditos, por mim tudo bem... Quanto aos softwares, caso gerem lucro significativo, devem ser comprados.

S: Com o prospecto atual da musica, a digitalização é algo inevitável. Isso já acontece em todos os gêneros musicais. Porém, a idéia da grandes gravadoras que controlam o que o povo ouve está com seus dias contados. A produção independente acontece não só na e-music mas como em outros estilos, exemplo disso é o site TRAMAVIRTUAL que distribui musicas de artistas independentes. Na minha opinião, não vejo mais a musica em si como objeto comercializável, afinal cultura não se comercializa. Porém, dessa forma, com a digitalização musical e internet, fica muito mais fácil de mostrar o trabalho e, na verdade, o artista começa a ganhar com seus shows. A idéia é valorizar ainda mais o artista e não as musicas em si!

C: Cada vez mais são os shows e não os discos que pagam as contas dos músicos. O compartilhamento de músicas na internet é só uma aceleração deste processo inevitável. Desde já autorizo qualquer um a compartilhar na internet. qualquer som que eu fiz, por favor (risos).

TFJ: Você enxerga possibilidades financeiras com suas produções?

T: Todo o meu hardware foi comprado com dinheiro gerado pela música... logo... dá dinheiro! É só saber aplicar e trabalhar MUITO!

S: Como disse na resposta anterior, música minha me dando dinheiro é bem pouco provável, apesar de já ter duas músicas lançadas na Inglaterra e mais outras duas a serem lançadas por outra gravadora. Nesse caso os ganhos financeiros seriam a discotecagem e Live PA em si! O SHOW em si!

C: Só produzindo acho difícil em um futuro muito próximo, pelo menos por aqui (no ES). Mas existe um porrilhão de novidades relacionadas com as habilidades necessárias para se produzir música e que rendem algum troco.

TFJ: Em que linha musical você situa suas produções?

T: Easy listening, chill house e breakbeat.

S: Undergorund House, Techno, Eletrotek e Deep House.

C: Esquizofrênico! Meu prazer em produzir ultrapassa em muito o amor por qualquer gênero específico. Com o NaPalma passeio por house, hip-hop, miamai bass, drum’n’bass, breakbeat e por aí vai. Os elementos de união são os orgânicos: vocal e percussão.

Nos meus trampos solo, gosto de achar que faço IDM (Intelligent Dance Music) e comecei agora uma contribuição à distância, um projeto de hip-hop a lá Roots Manoova e Beans. Na minha época quando atendia pelo nome de) Bonavides Função, brincava toscamente com o jungle. Alguém aí está afim de fazer uma banda de rock (risos)???

TFJ: Indique o nome do disco (e selo, país, etc.) e/ou o link na internet onde suas produções podem ser encontradas.

T: Disco “Soul Mais Bossa”, da cantora Tamy; selo Curve Music (UK); site www.tramavirtual.com.br/tourco.

S: Selos: Influential House Recordings (UK), Stripped Label Managment (UK) e Cold Tap Recordings (UK). No www.influentialhouse.co.uk
você pode comprar meus releases atuais - site do subselo da gravadora Stripped Label. www.tramavirtual.com - neste aqui você pode baixar demos de novas musicas minhas, procura por "dj sybel".

C: Procure NaPalma e Bonavides Função no site Trama Virtual. E tem um CD-Rom do NaPalma baratinho e que você pode comprar comigo mesmo!

Estes são os Entrevistados:
Fotos by: Kalunga


Tourco


Carranca


Sybel

16 comentários:

Mrlips disse...

Bom começo velho.

Se tiver tempo me mande um texto( via email)sobre o Krafwerk e a influencia do grupo na musica eletronica.

Kalunga disse...

Nossa Lips, a influência do Kraftwerk é imensa! Mas, não tinha um cara aí de Colatina que era um verdadeiro expert na banda (talvez um dos maiores do país)? De qualquer forma, eu poderia dar o meu ponto de vista sobre esta influência sem o menor problema, pois escreveria com o maio prazer! Aguarde para muito em breve!

A propósito, só não incluí o Bonna nesta matéria pela inviabilidade de contar com sua presença no tal encontro na casa do Tourco (que será provavelmente no meio de semana). Eu tenho um disco com as produções dele (Bonna) e, mesmo a maioria das faixas ainda serem bem cruas, umas três eu toco regularmente na pista no meu set de breakbeat. As idéias do cara, sem babação de ovo, são ótimas e eu enxergo um futuro promissor no que ele produziu ali.

Kalunga disse...

Este post, o anterior e os próximos têm como objetivo de informar quem estiver lendo sobre o universo da música eletrônica - que obviamente não caberia nem em trezentos posts. Alguns termos técnicos ou siglas podem soar incompreensíveis (como os softwares, equipamentos ou variações de gêneros da e-music), mas a idéia é fazer com que a pessoa tenha a curiosidade de se aprofundar nos assuntos.

pegoretti disse...

Gostei da entrevista. Em especial das respostas sobre a distribuicao das musicas na internet. Elas sao muito parecidas com a minha forma de pensar.

Kalunga disse...

Gleidson, ainda vai rolar um debate entre os três sobre estas e outras questões! Tem muita água pra rolar!

Anônimo disse...

Não sabia que o Bonna produzia breakbeat... legal. Me mostra depois o CD dele, Kalunga, no próximo quebra aqui em casa.

Mentor disse...

Bela entrevista! Acho que essa trilogia será muito informativa, o que abrirá novas oportunidades de conhecimento, sobre o gênero em questão, em nossas mentes viciadas...

"Até porque, no mercado do mundo pop, o velho rock morreu e a música eletrônica representa o futuro"... Ahahahah... Mas a culpa não é nossa não, é do mercado (ele não é tão apaixonado pelas coisas como nós).

Porém, o que se trata aqui é exatamente o contrário disso (dessa brincadeira) que eu falei, a idéia de seu post é fabulosa. Nele fica claro que há um universo de possibilidades (ferramentas, informações, idéias, meios, etc...)e principalmente, há pessoas apaixonadas, competentes e com muitíssima vontade de "fazer". E ainda digo mais, têm história, ou seja, vivências práticas (por mais que isso seja redundante) e complexidade teórica de estudo/conhecimento/aplicação para estarem expondo seus pensamentos sobre o assunto em questão (por mais que discordemos por completo ou parcialmente).

Kalunga, a e-music pop ainda não me toca, porém gosto muito das experimentações que ele se propõe em exercer ou até mesmo quando só um instrumento (ou acessórios para timbragem e efeito desse) coloca-se na posição de infinita possibilidade musical.

Um abraço: Turco, Paulinho bacalhau... E Sybel, acabo de te conhecer um pouquinho, aqui nesse entrevista, mas teremos outras oportunidades.

Kalunga disse...

Mentor, atualmente o rock é hype! Bandinhas cheia de pose indie (quem diria...) e que emulam milimetricamente grupos específicos dos anos 80 (muito em voga atualmente), 70 e 60. A e-music está passando por uma fase de maturidade, onde até mesmo o maior festival do gênero no Brasil, o Skol Beats, teve a sua última edição (lotada como sempre, diga-se) recheada de nomes obscuros ao público pop/rock, visto qu esta ponte não é mais necessária para sustentar grandes eventos neste segmento. Todas as pessoas que eu conheço que foram na última edição do SB piraram com as tendências novíssimas para as pistas ali apresentadas. Quem queria bandas pop travestidas de eletrônicas, ficou a ver uns poucos navios.

Kalunga disse...

A questão das 'possibilidades' foi muito bem exemplificada pelo Sybel: "Com o prospecto atual da musica, a digitalização é algo inevitável. Isso já acontece em todos os gêneros musicais. Porém, a idéia da grandes gravadoras que controlam o que o povo ouve está com seus dias contados. A produção independente acontece não só na e-music mas como em outros estilos, exemplo disso é o site TRAMAVIRTUAL que distribui musicas de artistas independentes."

Kalunga disse...

Também, como exemplifiquei no primeiro post, o caráter democrático em relação à produção musical promovido pela eletrônica foi responsável por uma reação da música negra, visto que o Governo Americano no final dos anos 70 cortou verbas para escolas públicas (conseqüentemente para as minorias) e muito pouca gente pôde estudar música. O resultado disso foi o surgimento do rap/hip-hop, totalmente calcado em bases e colagens eletrônicas, sibertendo todos os conceitos de melodia e harmonia ao pormover protesto em forma de falação (o rap em si). História essa que caminhou (e caminha) de mãos dadas simultaneamente com a música eletrônica. "Planet Rock", do Africa Bambaata sampleou Kraftwerk e isso gerou um big-bang infinito.

Anônimo disse...

E o Bacalhau? Foi limado mesmo? CADÊ VOCÊ BACALHAU???

Kalunga disse...

Valeu Bruninho! De qualquer forma, não tem nada de perfeito aqui não! Apesar da dedicação, o questionamento é sempre válido!

Turco: conversei com o Bacalhau hoje: ele vai mandar as respostas até o final desta semana. Ele não vai ser limado, hehehehehe...

Anônimo disse...

Sem querer sacanear... massssss... esse "biquinho" que o Bacalhau fez na foto... Tá demais, heim!?!?

Anônimo disse...

música é uma experiência intensa pra mim..rs

Anônimo disse...

música é uma experiência intensa pra mim..rs

Kalunga disse...

Bacalhau! Quinta agora tem o NaPalma e quero ver a galera pirar! Boto fé MESMO!

*Há algumas considerações sobre o show de vcs e que vou lhe falar pessoalmente.