sexta-feira, maio 19, 2006

Easy Fuckin’ Rider!



Era o clichê dos clichês! Para ir a Matilde (espécie de "São Tomé das Letras capixaba", á época) pela primeira vez, tinha que passar pelo ritual de iniciação para ser aceito pela galera quando chegasse lá. E tome Led Zeppelin, Raul Seixas, Janis Joplin (não virei fã de nenhum deles, por sinal), e exibições de "Hair" (deste eu consegui fugir na época!), "Woodstock", "The Doors" e "Easy Rider". Não! Não vou forjar aqui neste texto uma história envolvendo a minha pessoa como que se eu fosse mais velho do que sou, que tivesse vivido os anos 70 e curtido um barato legal. Este episódio se passou em 1995! Eu tinha apenas 19 anos, e vivia aquela fase típica de pós-adolescente, quando você tem idade pra dirigir, pra aprontar todas e ainda assim de viver na aba dos pais. É a época de fazer muita merda, de bancar o rebelde e também de correr para baixo da cama da mamãe quando o bicho pegava de verdade. Enfim, lá estava eu, aquele cara que gostava/gosta mesmo era de technopop, de Cure, de Front 242, de sons modernos, que odiava o chiado do vinil, que não suportava hippies e adjascentes... e que também queria se auto-afirmar a qualquer custo, mesmo que fosse preciso vestir uma máscara que não se encaixava na minha face.

Fomos eu, o Qualhada, o Lemmy, o Ganso e o Macaco assistirmos "Easy Rider - Sem Destino" na casa deste último. O ritual estava todo preparado: baseado apertado, vinho vagabundo em mãos, e toda aquela euforia de estarmos prestes a sermos apresentados a um dos ícones da contra-cultura - e também de uma época de acabara bem antes de nascermos, por sinal. Mente entorpecida, apertamos o play para darmos início a algo que, ao final, fugiria completamente de nossas expectativas iniciais. O começo da película já nos deu um impacto meio pesado. Afinal, Dennis Hopper e Peter Fonda de cara já mandaram pra dentro do nariz aquele pó branco vindo da Colômbia, negociado com umas figuras chicanas pra lá de esquema! Ué, a filosofia da parada não era a tal da lisergia, como imaginávamos antes? Cocaína não se encaixava nas nossas pobres e ingênuas mentes metidas a psicodélicas. Enfim, logo depois veio a clássica - e a mais clichê - cena do filme, com os caras pegando a estrada ao som de "Born To Be Wild". Agora sim! E o filme foi se desenvolvendo em suas partes. Do que nós esperávamos, haviam: maconheragem a rodo, assim como doses maciças de LSD e alguma putaria; trilha sonora fantástica (ainda que só rolassem, na maioria, faixas menos óbvias de artistas famosos); comunidades hippies; paisagens magníficas desbravadas pelo ronco das Harley Davidsons; um Jack Nicholson impagável; confrontos diversos com sociedades conservadoras - yeah! Teve tudo isso sim! Mas o filme nos jogou na cara também uma série de informações bem pesadas, enterrando vários chavões que achávamos que poderíamos viver iguais naqueles dias também. Ao final, todos saíram calados, ninguém se arriscou a dizer um pio. Estarrecidos como ficamos, deixamos para trás qualquer tipo de conclusão sobre o filme. Era mais cômodo picar a mula para Matilde e esquecer de "Easy Rider".

Todo aquele romantismo acerca de comunidades alternativas, de uso de drogas lisérgicas, de afrontas às sociedades conservadoras foi, ao meu ver, jogado água abaixo por "Easy Rider". Quando a dupla protagonista da história baixa numa comunidade hippie, se depara com problemas de saúde, de fome, e de individualismos que podem corroer qualquer ideal. Quando vai dar suas voltinhas e tirar uma onda com as gatinhas de uma cidadezinha qualquer, acaba pegando cana. Quando resolve finalmente tomar aquele ácido poderoso ao final do filme, já tendo alcançado o destino final previsto, rola uma bad trip absurdamente pesada, daquelas de desestimular qualquer empolgadinho imaturo (como éramos todos ali naquela sala, por sinal) a experimentar aquele tipo de coisa. Mas o pior mesmo ficou para o final. Tratava-se de um fim abrupto, seco, rápido e cruel. Era o término de um sonho, que mais parecia uma ilusão mesmo, e que acabara se tornando um pesadelo. E foi mesmo uma espécie de pesadelo que vivi, ao tentar me encaixar nos moldes de uma época que já foi há tempos. Era um martírio ter de participar de rodinhas de violão em volta da fogueira. Tinha vontade de vomitar quando sentia cheiro de insenso. E, ao mesmo tempo, me sentia pressionado a ter de encaixar naquele circo todo para não me sentir excluído. E sempre me voltavam à mente as cenas mais pesadas de "Easy Rider". E sabem porque? Porque simplesmente eu não aceitava viver algo que significou alguma coisa num passado do qual eu nem estava previsto a fazer parte deste mundo. Porque eu não suportava ter de ouvir conceitos tribalistas de gente que pregava a entrega a um ideal, mas que na prática só durava enquanto ia enrolando a formatura na faculdade - bancado pelos pais, é lógico! Hoje eu olho para aquela época com um certo alívio. Alívio este de hoje saber o que eu realmente quero para a minha vida, e também para descartar ideologias que não me servem e nunca me serviram. Vivi minha adolescência e início da fase adulta entre os anos 80 e 90. Se eu tivesse que tirar alguma conclusão sobre algo que veio antes de "minha época", que fosse verdadeira, e não imersa numa bolha nostálgica de outra era. Sendo assim, "Easy Rider – Sem Destino" é o filme mais anti-hippie que já assisti.

27 comentários:

caio disse...

Prepare-se para o meu megapost.

caio disse...

E eu efetivamente vivi alguma coisa dessa bagaça toda.

caio disse...

A Contracultura, a Contracultura... A oposição da onda desejava a mudança pela nova consciência, e quando esta não veio optou pelo estabelecimento puro de SUA consciência, esperando que ela (por si mesma) contaminasse o tecido social restante (quase todo, diga-se). A divergência se dava muito mais no campo prático que no campo teórico, visto que muitos dos pilares (saberes) da Contracultura baseavam seu discurso na possibilidade de EFETIVAMENTE algo ser criado pela criação pura, o conflito bastando por si mesmo, o contraste já dizendo alguma coisa ao OUTRO LADO. O OUTRO LADO em questão não representava, a priori, um inimigo a ser odiado, mas um sistema impessoal que só poderia ser subvertido pela doçura firme, pela razão emocionada, pelo sorriso determinado.

Kalunga, esta é, claro, uma divagação minha, eu, Caio, e mais nada. Não percebo (percebia, pois) a contracorrente como um dizer não; penso nela como um dizer sim a si mesmo, um dizer sim interior com óbvios reflexos lá fora. Não é uma questão hedonista, não só, mas uma oportunização do prazer, uma busca obstinada pero tranquila da estabilidade do espírito.

Em suma, por agora, é isto. É o que penso e digo.

caio disse...

Uma fuga e uma busca, simultaneamente. Hoje, como exemplo, nosso Motörhead é uma expressão contracultural (na ótica DELES) e uma posição assumidamente conservadora (em uma visão SÓ minha). Contraculturar, o que significa?

caio disse...

Não, claro, que isso diminua de alguma forma o Motörhead como uma instituição roqueira nossa; falo de conservadorismo do modo mais simples: o não mudar algo. E o Motörhead está bom como está, com seus problemas e suas virtudes.

Há um livro meu emprestado ao Mentor (aliás, emprestei-o no ano passado e aquele anão já disse que quer fazê-lo dele, o maldito) com o título "Contracultura", do Theodore Roszak, um pensador de força do fim dos anos 60. Livro lançado, aliás, em 1970, logo ali, em meio ao redemoinho. Pegue-o com ele, creio que ele possua subsídios que te interessarão.

caio disse...

O grande erro comum é jogar em uma mesma panela (sob o termo Contracultura) trocentos movimentos que brigam e remam bem longe do Monstro Sist. Se tudo é Contracultura, nada é Contracultura, parafraseando Ferreira Gullar.


Caralho, estou comentando o post e meus próprios comentários!

doggma disse...
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doggma disse...

Não só o Motörhead, como o AC/DC e os Ramones! :P

O final de Easy Rider é um soco no estômago mesmo. Desde aquela época já previam o fim das liberdades individuais.

But... "get your motor running", man. :)

Kalunga disse...

Caio, aguardo o teu post na esperança de enfim ler alguma coisa sobre o tema com propriedade, pois o meu texto teve o objetivo de colocar para fora a minha visão de cones da Contracultura sem ter vivido praticamente nada e na época quando ela foi realmente significativa. Eu sei que posso angariar antipatia de muitos por aí, mas eu me expus parap oder expurgar tais sentimentos.

E eu quero ler este livro, porra!!!

Aiás, cadê o Mentor??

Kalunga disse...

Fala Doggma!!

Rapaz, o "Motorhead" a que o Caio se refere é uma espécie de substantivo criado por um círculo de amigos, mas que tem ligação direta com a banda do Sr. Kilminster.

Explicando: há mais de dez anos atrás, um grupo de amigos se reunia numa salinha para degustarmos um wisky (surrupiado do pai de um de nós) e ouvirmos atentamente os discos (em vinil!) 1916 e Orgasmatron. Tanta mitologia acerca do líder do Motor tornava o tal encontro semanal uma situação mítica - e que perdura até hoje.

Para este grupo de amigos, "fazer um Motorhead" é simplesmente uma reunião de brothers que têm em comum o gosto por determinados sons, a audição de nividades sonoras, a predileção por bebidas de boa qualidade (afinal, estamos todos ficando velhos e nossos fígados exigem mais "requinte", hehehehe...).

Resumindo: trata-se de uma reunião de amigos em torno de música, bate-papo e bebidas. É um rito sagrado, que independe das fases diversas que nossas vidas sempre passam - vai sempre acontecer! E, segundo Caio, também representa um certo tipo de Contracultura. Ali, no "nosso Motorhead", esquecemos de tudo e apenas celebramos a amizade, a diversão, o apreço por música, por uma boa conversa, por uma cerveja bem gelada.

Tem gente que critica, que considera uma espécie de "reunião de ogros" e tal. Bom, nos Motorheads não ficamos fazendo "tipinho", caras e bocas. Somos o que somos, cada qual à sua maneira), mas amigos acima de tudo.

Garanto que o Sr. Lemmy Kilminster se sentiria à vontade numa reunião como esta.

E garanto que muita gente aí que não se conhece que faz Motorheads por aí, também à sua maneira.

Anônimo disse...

aliás precisamos fazer mais motorheads!

com tanta merda que eu ouço por aí seria muito bom reunir os amigos cujo gosto musical eu confio para ouvir um som e ficar bêbado. isso é diversão!

e eu, como bom alienado que sou, nem comento a respeito desse lance de contracultura. só sei que o povo se divertia! ideal é o caralho, o que interessa são as idéias!

abs!

Led.

Kalunga disse...

Led, cê tá na área???

Se estiver, MOTORHEAD now!

O enrolado aqui sou eu, hehehehe...

Abração!

Anônimo disse...

tô no Rio mesmo... acho que só vou aí em vix no feriadão do dia 15 mesmo, vamo ver.

e te digo outra coisa:

The Pot (faixa 5 do disco 10.000 Days do Tool) é a música do ano até agora! viciante.

abração!

Anônimo disse...

The "Pot" viciante??? Isso é um trocadilho??? hehehe

Kalunga disse...

Eu ainda não consegui baixar esta porra!!! Estou desesperado p/ ouvir o Tool novo, pois sou fanático naquilo!

Feriadão vamos fazer motorhead, então!

caio disse...

Pois é, aquela banda Ócio que me fazia revirar as vísceras na Barra do Jucu, anos atrás, já era. Estive na UFES quando da festa da Quase e tive a curiosidade de ver o show dos caras, sem nenhuma informação nova, nada. Fiquei só pra checar se os caras haviam mudado algo em 3, 4 anos. E mudaram, e arrebentaram, e fizeram o melhor show de uma banda capixaba que já vi aqui no estado ou fora dele. Quero crer que o disco mande igualmente bem (tenho impressões positivas de Paulinho, outro cara insuspeito), e espero que esse show no Teacher´s Pub não me queime a porra da língua. Vamos lá, caralho!!!! Porra!

Anônimo disse...

em homenagem ao Motorhead:

http://www.youtube.com/watch?v=c5uoo1Kl_uA

abrá!

Led.

Kalunga disse...

hhahahahahah!!! Seu Madruga devia ser o maior cachaceiro!

Fora que o Kiko vivia travado... Aquele olho era esbugalhado demais!

***

Caio, quarta eu já havia marcado outra parada. Bom, vi um show deles no começo do ano passado no Entre Amigos (abrindo p/ o Butcher's Orchestra) e achei que a banda tinha melhorado muito, mas ainda ficava devendo. Fica pra outra e com adica anotada.

caio disse...

Kalunga, começo de 2005 pra meio de 2006, tempo pra caralho. As coisas devem ter mudado um bocado.

Well, ok.

caio disse...

Você é um bastardo maldito dos infernos, sua vaquinha peluda!!!

Vamis visitar o Mentor, porra! O cara tá lá em Ponta da Fruta sozinho, na casa. É só levar as geladas, que já tenho aqui comigo.

Vamos lá, porra!

Maldito!

Kalunga disse...

Sexta rola, sábado eu vou agitar uma festa no Simpson.

caio disse...

Vc não queria o Bar do Russo? Bem, estou contando a sua história em blocos no meu blog:

www.thebasementtapes.blogspot.com

Kalunga disse...

mal sabe vc que já estava acompanhando!

Anônimo disse...

Sabe o que é bem legal?
Primeiro - saber que o Motorhead é apenas um "momento ogro". E que saindo dali temos, sim, MUITO o que conversar sobre milhares de outros assuntos.

segundo - Achei esse filme "enjoativo", mais no sentido de causar náuseas pela sua estética e ideologia do que pela produção tosca (que nem existe, diga-se de passagem). A Bad Trip é a cena. Passei mal. Muito, mas muito palha.

terceiro - Porra, finalmente redescobri esse blog. Viva os textos do Kalunga. Ao ler seus textos tenho vontade de fazer um Motorhead.

Taylor

Kalunga disse...

Taylor, Motorhead é algo sagrado. E te mudado algumas coisas, tipo: estão rolando audições específicas de algum som novo/velho. Por exemplo, fizemos audições de Eagles of Death Metal, Mark Knophler novo, Ministry novo, Timo Maas novo, Som Nosso de Cada Dia, e por aí vai.

São motorheads no meio da semana, dias que p/ mim, o Turco e o Paulinho são melhores por conta dos horários de trabalho. Mas às vezes rola na casa do Lemmy, e lá já ouvimos Samhain, por exemplo, que era um som que pouca gente já havia ouvido de fato dentro de nossa turma.

Eu não tenho nenhuma pretensão mais em termos de motorheads que não sejam os rocks onde os amigos se encontram. O som, por incrível que pareça, está se tornando literalmente pano de fundo. Aqueles estresses sobre som que já rolaram em antigos motrheads, pra mim já fazem parte de um passado já distante.

E também rolam os famosos "Frios do Posto", lá na Lama, final de rock, no carro de Paulinho, rolandoalgumsom e as eternas saideiras.

Enfim, o que importa mesmo é a compania dos amigos. Até ver jogo do Flamengo (e torcer!) eu ando fazendo!

valeu!

Anônimo disse...

Here are some links that I believe will be interested

Anônimo disse...

I like it! Good job. Go on.
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